Os frades de pedra foram instalados, em Pelotas, por volta
do início da década de 70 do século XIX.
Os gastos despendidos com tal “benfeitoria” foram de tal
ordem que chamando a atenção do redator do contemporâneo jornal Correio Mercantil disse ele, em
editorial, que a Câmara Municipal de 1876 deveria considerar como exemplo a não
ser seguido os erros de seus antecessores, que gastaram “fabulosas fortunas em
frades, correntes e arvoredos...”.
Decorrido algum tempo
desde o alerta dado pelo jornalista, e em consequência dos inúmeros acidentes
causados por aqueles frades, voltava ele, através de novo editorial no Correio Mercantil, a chamar a atenção da
população e dos representantes da Câmara Municipal, em uma campanha, para que se
pusessem abaixo, pelo menos dois deles. Como duas estátuas de bronze, duas
sentinelas avançadas do perigo e da desgraça, lá permaneciam ainda dia 3 de julho
de 1877, na volta do trilho da Praça Pedro II [atual Pedro Osório], lado da Rua
do Imperador [atual Rua Felix da Cunha], os dois pré-históricos frades que há
poucos dias haviam atentado contra a existência de “um estimável cidadão”.
Inflexíveis como dois pachás, atrevidos como dois Átilas
[referência ao rei dos hunos], ameaçadores como dois policiais, os frades aos
quais o jornalista se referia, mais temíveis que um exército de frades de São
Bento, representavam uma violência constante à segurança da população, um
terror abominável aos passageiros dos bondes.
Precisavam ser destituídos, a bem do serviço público, do
posto que ocupavam.
Se a ilustríssima câmara municipal se dignasse mandá-los
demitir, o jornalista lhe seria agradecido.
Ao contrário, gritaria sempre: abaixo os frades.
“Abaixo os frades”, fora o grito que se erguera, dia 10 de
julho de 1877, contra dois inocentes que se encontravam colocados junto ao
calçamento que seguia em direção à Praça Pedro II, em frente ao sobrado do Sr.
tabelião Neves. E os frades foram abaixo, na noite de 7 de julho de 1877; não
por ordem de autoridade competente, e sim por bem manejada serra, que os
decapitou sem piedade.
Dos dois frades, que não eram ultramontanos, dizia o
jornalista do Diário de Pelotas, só haviam
restado as bases, isto era, um pedaço como de palmo e meio, fora da terra,
prejudicial ao trânsito público.
Em oposição aos que pediam a retirada dos frades, dentre
estes o Correio Mercantil, colocou-se
o Diário de Pelotas por entendê-los
muito necessários, pois serviam de sentinelas avançadas à calçada que dava
acesso ao chafariz da Praça, para que não fosse ela maltratada pelas pesadas
carretas, que faziam o serviço da cidade ao porto.
Abaixo os FRADES, gritavam uns; levantem-se os FRADES,
gritava o Diário de Pelotas, por ser
mais conveniente não só ao público como ao passeio [caminho] que, da embocadura
da Rua do Imperador [atual Felix da Cunha] ia de encontro ao chafariz da praça;
portanto: levantem os FRADES.
Justiça popular
Sob a chamada de Justiça
popular, o Correio Mercantil, de
11 de julho de 1877, dizia ter gritado tanto “abaixo os frades”, que os frades
próximo à Rua do Imperador, junto ao trilho, foram mesmo abaixo. Destruídos,
arrasados pela base e talvez reduzidos a cinza, se não por meio de um processo
regular, ao menos por efeito de uma justíssima sentença popular.
Tribunal augusto e soberano: o povo.
Pedira, implorara o jornalista em nome da humanidade, a
condenação daqueles “malvados monstros”, e nunca fora atendido, sem dúvida,
acreditava ele, porque se tratava de frades
e estas entidades mereciam os respeitos de todos os partidos políticos da
“atualidade”.
No entanto, sucedeu o que sempre sucedia em tais casos: a
indignação pública crescera, como cresce a lava ardente do vulcão e a cratera
ressoou. E os frades sucumbiram como sucumbem os tiranos depois do morticínio
de suas vítimas.
Abençoada serra e benditos pulsos que dirigiram a derrubada.
Fora um relevante serviço prestado ao próximo.
Aprendessem os governos naquele sublime exemplo de soberania
popular.
Anátema sobre aquele que tentasse restabelecer o domínio dos
frades.
Os frades sobreviventes
Em matéria divulgada na edição de 21 de janeiro de 1945, o Diário Popular, sob a legenda de “Flagrantes
Urbanos”, com foto de Ramão Barros, dizia que aparentemente inexpressiva essa
coluna de granito, que não passara despercebida ao “olho clínico” do experiente
fotógrafo, que a havia fixado para aquele espaço, era ela, entretanto uma das
poucas relíquias evocativas de um passado longínquo que escaparam ao vendaval
remodelador das revoluções urbanísticas.
Existiam, já naquele período, segundo o jornalista, apenas três
exemplares desses frades de pedra em nossa cidade, com que os antigos
previdentemente assinalavam os lugares por onde os veículos não deviam
trafegar, porque naquele tempo, é claro, não existiam as calçadas.
Eram, portanto, os sinaleiros da época e, por certo,
constituíam, também, sintoma marcante de progresso.
Apelava o jornalista ao prefeito, para que não consentisse
que fossem retirados esses centenários frades de pedra que conheceram esta
cidade ainda menina, dos lugares onde se encontravam.
Parece não haver dúvida alguma da função desses frades, que
não era a de como pensavam muitos, e talvez ainda pensem alguns, a de servir
para que os cavaleiros e carroceiros amarrassem seus cavalos ou veículos.
Ainda que a reportagem do Diário Popular não nos indique quais e onde estavam localizados os
três frades existentes naquele ano, é provável supor que o flagrado pelo
fotógrafo Barros estivesse localizado na Rua General Osório e, os outros dois,
os que ainda existem na Rua Andrade Neves esquina Tamandaré e na Gonçalves
Chaves, fundos da Igreja da Luz.
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Fonte de pesquisa:
Bibliotheca Pública Pelotense-CDOV
Revisão do texto: Jonas
Tenfen
Fotos: acervo de A. F.
Monquelat
muito fera Sr. Adão, ja havia reparado nessas peças na rua e não sabia o nome.. bah muito fera, paranbens pela pesquisa. abrá
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ExcluirValeu Lucian, grande abraço.
ExcluirAinda existe um perto da igreja da luz
ResponderExcluirSim Régis, esse é o da foto em preto e branco, com uma seta indicativa, que ilustra o artigo.
ExcluirMonquelat, o problema do frade da andrade neves, é que naquela esquina existiu por longos anos uma 'pensão' - a pensão da maria das te**s. portanto, no imaginário local, o monumento em questão servia para identificar tal 'estabelecimento comercial'. Ricardo Asso Mendes. adoasso@gmail.com
ResponderExcluirMeu caro, é realmente uma bela analogia entre o frade (símbolo fálico) e a Pensão da Suzana (se não me falha a memória), mas a razão da instalação desses frades era outra, que não a de indicar tais casas. Abraço.
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