sexta-feira, 28 de outubro de 2016

O pecado (parte 8)*

            



Desordem e prisões na bodega Despacho de Madame
Dia 12 de dezembro de 1885, à noite, na famosa bodega denominada Despacho de Madame, à Rua 16 de Julho [Dr. Cassiano], houve grande desordem entre diversos indivíduos que ali se encontravam em completa orgia, segundo informava o jornal Rio-Grandense.
A polícia, que em tudo metia o bedelho, conduziu os turbulentos para a cadeia, para ali esfriarem um pouco o ardor bélico.
A proprietária da tal bodega, Tereza Lopes, italiana, e que também exercia a profissão honrosa de cafetina, foi presa e recolhida à cadeia, por desobedecer às ordens da autoridade policial.
Seria, dizia o jornalista, um grande serviço prestado à moralidade se o Sr. major delegado de polícia mandasse fechar aquela casa, verdadeira cova de caco [covil de ladrões].

Um foco de imoralidades
Foi necessário, dizia o Diário de Pelotas, que dia 22 de dezembro de 1885, às 2 horas da madrugada, se desenvolvesse uma grande desordem em uma bodega à Rua 16 de Julho [atual Dr. Cassiano], entre as de São Miguel [15 de Novembro] e General Vitorino [Anchieta], para a polícia tomar conhecimento das cenas indecorosas como as que diariamente presenciava a vizinhança daquele foco de imoralidades.
Viviam ali quatro mulheres que reuniam ,todas as noites, certa malta de vagabundos para praticarem cenas que a decência mandava calar.
Às autoridades, a imprensa havia solicitado o fechamento ou a mudança de local daquela bodega, e elas permaneciam surdas àquelas solicitações; no entanto, a imprensa continuaria aguardando providências enérgicas e ativas por parte das autoridades policiais.

Por causa de uma demi-monde
Sem que houvesse dia em que a imprensa moralizada e honesta não registrasse um fato que destacasse a energia e o grande devotamento consagrados à causa pública pelas autoridades ordeiras e sensatas da situação, foi a observação feita pelo Diário de Pelotas antes de noticiar que naquele domingo estas autoridades haviam praticado mais uma das suas heroicas façanhas.
O fato foi que por volta das 5 horas da tarde, chegara ao escritório do jornal, com o braço todo cortado e vertendo grande quantidade de sangue, o Sr. Alfredo Marcelino de Souza, que contou o seguinte:
Estando ele a conversar com uma daquelas dulcineias do demi-monde, à janela, chegou até ele o soldado Elpídio e começou a injuriá-lo e proibindo aquela conversa.
Alfredo, porém, não fez caso das injúrias e ameaças do Elpídio e continuou,a conversação voltando a novamente ser caluniado e ouvindo que aquela mulher era sua amante e, portanto, ele usando de seus direitos não admitia que conversasse com semelhante indivíduo.
Vendo Elpídio o pouco caso dado às suas palavras e ordens que Alfredo fazia, puxou enfurecido do chanfalho e, sem mais nem menos, começou a descarregar pranchadas no indefeso Alfredo, deixando-lhe o braço completamente lesionado.
Naquele ínterim, Bernardino Lemos Xavier, que estava em uma taverna próxima, foi em socorro do amigo, outra vítima do furor bélico de Elpídio, saindo também com alguns talhos profundos na cabeça.
Saindo dali, Alfredo foi à casa do Sr. major Macedo queixar-se da arbitrariedade cometida por um representante da ordem.
O Sr. major Macedo, porém, a nada atendeu e disse, textualmente, “que era pouco, deviam é ter-lhe quebrado a cabeça”.
À vista daquilo, Alfredo retirou-se pacificamente e foi pedir na redação do jornal que dessem conhecimento ao público daquele ato de bravura.
O jornalista encerrava dizendo que o ocorrido se passara tal qual era por ele narrado.

Meretriz se suicida com tiro no peito
Pelotas acordou dia 12 de janeiro de 1886 com o rumor de uma notícia espantosa.
A meretriz Maria José Pereira, moradora à Rua Voluntários da Pátria, esquina Gonçalves Chaves, natural de Bagé, mulher ainda jovem, apareceu morta, completamente vestida e penteada, tendo sobre o coração um profundo ferimento de bala.
As circunstâncias que rodearam esse caso eram as mais misteriosas possíveis, e geraram várias versões na imprensa da época.
Tendo o jornalista do Correio Mercantil assistido ao inquérito na secretaria de polícia, narrou-o dizendo que, por volta das 20 horas da noite de 11 de janeiro de 1886, regressaram de um passeio aos Campos Elíseos as meretrizes Maria José pereira e Teodora Lopes dos Santos e que moravam juntas na casa e rua já citadas.
Pouco depois, apareceu por lá Diogo Ricardo Higgins, bem como um empregado da companhia Great Atraction.
Este se retirou com Teodora Lopes, deixando Maria José Pereira com Higgins.
Pouco depois, o Sr. Higgins saiu e chegou o Sr. José Pedro Duarte, que não passou do corredor do prédio, isto antes das 22 horas, hora em que ele retirou-se.
Não se sabendo o que aconteceu depois disso.
Certo é que entre 23 e 24 horas, o Sr. José Pedro Duarte, segundo o seu depoimento, foi chamado por uma mulher vizinha de Maria José; dizia ela que a sua companheira se tinha suicidado, disparando um tiro.
Respondeu o Sr. Duarte que não tinha coisa alguma que ver com semelhante ocorrência e que fossem chamar um médico, mas, por generosidade, saiu ele também para chamar o Sr. Dr. João Chaves Campelo, e foram ambos para casa de Maria José, encontrando-a morta.
As diversas testemunhas ouvidas foram contestes em suas afirmativas.
Não conheciam inimigos de Maria José, e quase todas as pessoas envolvidas disseram que ouviram muitas vezes a finada dizer que: “se fosse abandonada se suicidaria”.

Sarilho entre damas da vida solta
Às 22 horas do dia 16 de fevereiro de 1886, houve um alarido infernal na Rua General Neto.
Cinco damas da vida solta esmurravam-se com todas as forças do furor e vociferavam quantos termos delicados aquela patuleia [ralé] tinha no bojo do seu vocabulário.
Atraído pela desordem, um sargento da polícia pública não conseguiu prendê-las, por se terem asilado em um estabelecimento de jogo, que constava funcionar por ali.

Descoberto o autor do furto das joias da meretriz
Noticiava o jornal Rio-Grandense de 16 de março de 1886 que o autor do furto que há dias fora feito das joias da meretriz Virginia havia sido descoberto pelo subdelegado de polícia, Sr. Manoel Rosa.
As joias foram encontradas em mãos de um tal João Antônio dos Santos, que declarou havê-las comprado a um desconhecido, pela quantia de dez mil réis.
Pois que ficasse de férias o desconhecido e ficasse bem conhecido o “honrado” Santos, que estava estabelecido, segundo o jornalista, à Rua Andrade Neves.



                   Continua...



____________________________________________________________                    * Extraído do livro, ainda inédito, A princesa do vício e do pecado
Postagem: Bruna Detoni
Seleção de imagem: Janaína Vergas Rangel
Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública Pelotense-CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen      


sexta-feira, 21 de outubro de 2016

O pecado (parte 7)*

            
            A.F.Monquelat


Ó Antônio, não bulas com a dulcineia dos outros
O súdito português Antônio d’Oliveira, patrão do iate Oliveira 1º, estando dia 28 de maio, à noite no botequim São João, na Rua General Osório, foi preso pela polícia do Sr. Caldeira, em virtude de ter se dirigido a uma dulcineia, amante de um soldado.
No momento da prisão, o Sr. Oliveira fez algumas objeções, que bastaram para a polícia cair-lhe de espada, ferindo-o na cabeça.
A vítima do furor bélico dos soldados da polícia foi recolhida ao xadrez policial, donde saiu no dia seguinte ao meio-dia, por pedido de diversas pessoas.
Os autores da agressão “ficaram em santa paz”.
Encerrando a notícia dizia o jornalista que a polícia precisava ser policiada e indagava se aquele fato não era merecedor da intervenção do vice-consulado português?

Desordem na bodega da Clarinda
Dia 4 de junho de 1885, à noite, no porto da cidade, na bodega de uma tal Clarinda, bodega esta, que, segundo o jornalista do Rio-Grandense, há muito deveria estar fechada por ser um foco de vagabundos e desordeiros, deram-se diversos distúrbios, resultando sair ferido um indivíduo.
Avisado do ocorrido o Sr. delegado de polícia, que se encontrava no Teatro, mandou quatro praças de polícia prender os desordeiros; chegados os praças à tal bodega, estes prenderam dois indivíduos, indicados como autores das desordens e ferimentos.
Quando as praças vinham com os dois presos “para a cidade”, foram alcançadas e atacadas por vinte e tantos indivíduos, de diversas nacionalidades, que, armados de cacetes e pedras, conseguiram livrar os presos, depois de terem ferido duas das praças, que caíram sem sentidos.
Os soldados atacados foram José Maria da Silva, ficando com um grande ferimento na cabeça, e João Adriano, com um ferimento junto à fronte esquerda, atingindo o ouvido.
Os feridos foram medicados, à uma hora da noite, na farmácia de propriedade do Sr. João da Silva Silveira [Farmácia Popular].
Dos agressores, constava-se que também ficara ferido um “preto”, marinheiro.
Sabedor do fato o Sr. alferes Nuno de Macedo, comandante da polícia particular, seguiu para o porto com suas praças, porém já não encontrou os desordeiros.
Não era a primeira vez que na bodega da tal Clarinda se davam desordens daquela natureza; ali se jogava e se bebia até alta noite, sem que as autoridades policiais dessem a menor providência para coibir semelhantes abusos.
Entendia o jornalista ser o próprio delegado de polícia o responsável daquelas desbragadas orgias, que consentia que bodegas daquela espécie, na qual se dera a desordem, estivessem abertas, com ajuntamentos ilícitos, até fora de horas.
Usasse o Sr. delegado de polícia de toda a vigilância naquelas bodegas, que assim os crimes não se repetiriam com tanta assiduidade.


Orgia e sarilho

Às 23 horas do dia 22 de julho de 1885, em uns casebres juntos à venda do Sr. José Barun, à Rua Sete de Abril [atual D. Pedro II], houve grande sarilho entre diversos escravos e pessoas livres que estavam “em completa orgia”, resultando renhida briga.
Aparecendo a polícia particular e alguns praças da seção fixa, para apaziguarem os turbulentos, foram recebidos a ponta de facas e a cacetes.
A polícia, apesar da belicosa atitude dos turbulentos, conseguiu pôr em fuga alguns e desarmar a outros.
Entre os brigões, encontrava-se o “preto” Paulo, contratado do Sr. Joaquim da Silva Tavares, que saiu ferido, deixando na fuga o poncho e o chapéu.
Um praça da seção policial, ordenança do Sr. delegado de polícia, ficou bastante ferido.
A polícia particular, segundo o jornalista, prestara muito bons serviços, do contrário o conflito teria tomado grandes proporções.
O Sr. major delegado de polícia, tomando conhecimento do fato, daria as providências necessárias para a punição dos orgíacos briguentos.

Ferimento na bodega da Clarinda

Dia 26 de julho de 1885, na bodega da Clarinda de tal, no porto da cidade, mais ou menos ao meio-dia, o pardo Geminiano feriu gravemente com uma facada o pardo Júlio Joaquim Vieira, trabalhador na barraca do Sr. Fraeb.
O criminoso fugiu, e o ferido foi conduzido à Santa Casa de Misericórdia, onde ficou em tratamento.
Até o final da tarde do dia seguinte ao ocorrido, nenhuma autoridade havia tomado conhecimento do fato e, portanto, não se procedera ao auto de corpo delito, nem deram a menor providência para a captura do criminoso.
“Isto não se comenta”, foi a frase final da notícia.

Os cortiços do Sr. Barun, ou o Beco da Muquirana

Em matéria veiculada no Rio-Grandense de 10 de dezembro de 1885, diz aquele órgão de imprensa que os ilustres chefes de família, moradores das imediações dos casebres, por outra, das pocilgas de propriedade do Sr. Manoel Rodrigues Barun, à Rua Sete de Abril [atual D. Pedro II], há muito que pediam providências às autoridades policiais sobre os escândalos cometidos pelas devassas moradoras daquelas pocilgas que se embriagavam na taverna do Sr. Barun e praticavam cenas tão escandalosas, tão repugnantes, que as famílias viam-se na necessidade de fecharem suas janelas para não presenciarem os espetáculos dessas megeras.
Avisado que fora o Sr. Barun não só pelos chefes de família, como pelas autoridades policiais, para fazer retirar aquelas megeras de suas pocilgas, ele nenhum caso fez, e o escândalo continuou.
O subdelegado de polícia Sr. Manoel da Silva Rosa, escudado na lei, ordenou que os inquilinos do Sr. Barun se mudassem, o que fora cumprido.
Era falso, portanto, que aquela autoridade tivesse ameaçado de meter na cadeia as pessoas que fossem morar nos cortiços - pocilgas do Sr. Barun -; a verdade era que a autoridade em bem da moral pública, não consentia que continuassem os escândalos e as imoralidades cometidas diariamente naquele lugar, batizado pelo povo de Beco da Muquirana.
Os cortiços, como se lhes chamava o Sr. Barun, eram imundos e sem a menor higiene, e neles só tinham habitado o que havia de mais infame na última camada social, cujos moradores por diversas vezes tinham sido presos como desordeiros.
Não fazia muito tempo, por causa dos moradores daquelas pocilgas e dos ajuntamentos ilícitos na taverna do Sr. Barun, que sua esposa tivera a cabeça quebrada por um praça do contingente de linha; fato esse que se dera na rua, conforme o próprio Sr. Barun informara ao Sr. major Macedo, no Teatro Sete de Abril, e na mesma noite do ocorrido.
O Sr. Barun já entendia, portanto, que o subdelegado Rosa tinha procedência e razão em atender a reclamação dos chefes de família, seus vizinhos, em ordenar a mudança das megeras que moravam em seus cortiços, e que tantas imoralidades praticavam.



                   Continua...



____________________________________________________________             *Extraído do livro, ainda inédito, A princesa do vício e do pecado
Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública Pelotense-CDOV

Revisão do texto: Jonas Tenfen       

quinta-feira, 13 de outubro de 2016

O pecado (parte 6)*

            


Há mulheres de má vida na bodega
O jornal A Nação em edição de 12 de novembro de 1884 comunicava à autoridade policial ter recebido denúncias de que em certa locanda, além do Arroio Santa Bárbara e próximo à ponte, estavam acontecendo cenas imorais.
Segundo a denúncia, naquela bodega reuniam-se diversas mulheres de má vida exibindo-se tão escandalosamente que as famílias que moravam na vizinhança viam-se coagidas a retirarem-se das janelas para não presenciarem as mais torpes obscenidades.

Os vizinhos indignados...
À Rua 16 de Julho [atual Dr. Cassiano] nº52, quadra entre as ruas Andrade Neves e São Miguel [atual 15 de Novembro], em frente ao palacete do “honrado industrialista” Sr. Joaquim da Silva Tavares, moravam umas mulheres alemãs, mães e filhas, cujo comportamento irregular e altamente imoral muito estava indignando as “pessoas pacatas e moralizadas”, que moravam por aquela vizinhança.
Os Srs. Delegado e Subdelegado de polícia já tinham sido avisados do comportamento daquelas mulheres de má vida, porém não constava ao jornalista que tivessem dado providências aquele fato.
Em todo o caso e em nome dos “vizinhos indignados”, julgava o jornalista prestar um bom serviço à moralidade pública, provocando as dignas autoridades policiais para porem fim a tanto desaforo.

Policie-se a polícia
O estado de desmoralização e desordem a que chegara a seção policial da cidade de Pelotas, comandada pelo Sr. Major José Joaquim Caldeira, estava exigindo providências das autoridades superiores da Província.
Os soldados da seção, com raras exceções, eram indivíduos desclassificados e oriundos “da última camada social para sentarem praça”.
Desordeiros por profissão, em vez de serem garantidores da ordem e zelarem pela tranquilidade pública, eram os primeiros a provocarem os cidadãos pacatos, levando as suas provocações até as próprias autoridades policiais, desobedecendo as suas ordens, contando sempre com a impunidade.
As queixas dos agredidos pela polícia eram diariamente levadas ao conhecimento do comandante da seção, porém, este, pelo amor que tinha aos seus subordinados, não tomava a menor providência, e estes reincidiam nos abusos, certos de que nada lhes aconteceria.
Dizia o jornalista que no tempo em que eram comandados pelos enérgicos capitães Lopes, Delfino e Casado, não se via a desmoralização “que hoje” se notava: os praças da seção não eram encontrados, “como agora”, dançando nos botequins da Rua General Osório e provocando os tropeiros por causa das dulcineias, que por ali frequentavam.
A polícia de então, podia ser dito afoitamente, era um couto de ébrios e vagabundos, que envergonhavam a civilizada cidade de Pelotas.
Passemos aos fatos.
Na noite de sábado (23.12.1884), a patrulha da Rua General Osório, a mando de uma mulher de má vida, que morava em um botequim, espancou a chicote o súdito português José Joaquim Ferreira de Castro. Aquele escandaloso fato fora presenciado por mais de cem pessoas, e os agressores, que foram os soldados Elpídio e Artur, só deixaram a sua vítima depois da chegada do “digno comandante” da polícia particular.
Levado o ocorrido ao conhecimento do Sr. Major Caldeira, este não deu a menor importância e ficou impune um crime que “em outro lugar talvez fosse severamente punido”.
Já no domingo à noite, o mesmo soldado Elpídio, estando de patrulha na referida Rua General Osório, permitiu que uma malta [bando] de seis indivíduos espancassem um infeliz pardo que viera de Rio Grande naquele dia. Um cidadão, ao passar no momento do espancamento, com aquiescência da polícia, reclamou contra o procedimento desta, e foi desrespeitado e insultado “pelo célebre soldado Elpídio”.
O cidadão dirigiu-se ao Teatro e fez ciente ao comandante da seção Sr. Major Caldeira o procedimento do seu comandado; o Sr. Major contentou-se, depois de findar o espetáculo, a mandar chamar ao quartel o soldado Elpídio, que já estava a paisano “dançando nos botequins”, e como Elpídio tivesse negado o ocorrido, mandou-o continuar se divertindo.


Com vistas à polícia
Na Rua da Constituição [atual Álvaro Chaves] havia uma bodega da parda Cecília, lugar em que todas as noites davam-se desordens e cenas “tão repugnantes e imorais” que as famílias moradoras nas circunvizinhanças privavam-se de chegar às janelas.
A polícia, se fosse mais cumpridora de seus deveres, poderia dar um corretivo à tal Cecília, e recomendar-lhe mais moralidade em sua bodega.

Alemães enfrentam a polícia armados com achas de lenha
Domingo, 22 de março, à meia noite, encontravam-se alguns alemães e diversas mulheres da “vida virada” em grande algazarra e borracheira em uma bodega em frente ao Mercado, quando, para a infelicidade dos pândegos, apareceu “a ativa polícia particular” que fez dispersar os alegres fregueses.
Dois deles, protestando contra o ato da polícia e armados de achas de lenha tentaram opor-se à prisão, mas os praças da noturna não se intimidaram e prenderam os filhos da pátria de Bismark, trancafiando-os a seguir no xadrez para curarem a bebedeira.
Porém, segundo os “alemães que se achavam no divertimento”, a coisa não fora bem assim como a imprensa divulgara e, como forma de restabelecer a verdade dos fatos ocorridos na “casa particular” em frente ao Mercado, e não bodega conforme, por mal informado dissera o jornal Onze de Junho, alega alegaram que estavam diversas pessoas se divertindo na casa particular de propriedade do Sr. Guilherme Riuster, com algumas senhoras casadas e solteiras, e não da vida airada, quando apareceu a polícia particular invadindo a casa, de espadas desembainhadas e ordenando que cessasse o divertimento, ao que, incontinenti eles obedeceram; levou a polícia para o quartel dois dos presentes, que estavam um pouco perturbados, mas que não cometiam desordem e nem faltaram com o respeito aos praças.
Essa era a verdade tal qual se passara. Não sabendo eles que era proibido divertirem-se dentro da própria casa; porém, se a polícia assim o queria, paciência.
Para que não houvesse engano, preveniam que o letreiro Hotel Izola & Caprera pertencia à antiga casa, que havia ali antes, e não à presente.
“Louvores aos alemães”.

A bodega da parda Cecília volta à cena
Cecília, proprietária da bodega da Rua Constituição [atual Álvaro Chaves], querendo festejar o sábado de Aleluia, anunciou com estrepitar de foguetes e embandeiramento um grande baile, que se realizou dia 5 de abril de 1885.
A polícia não gostou da graça porque Cecília não tinha pago os devidos emolumentos, e quando os convivas estavam no melhor dos prazeres, mandou encerrar o baile e intimou a “dançarina” Cecília a comparecer no dia seguinte na secretaria da polícia, a fim de receber o merecido castigo por sua ousadia de dar baile sem o competente pagamento do imposto.



                   Continua...



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* Extraído do livro, ainda inédito, A princesa do vício e do pecado
Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública Pelotense-CDOV

Revisão do texto: Jonas Tenfen       

quarta-feira, 5 de outubro de 2016

O pecado (parte 5)



 
 
 
O pecado (parte 5)*
pelotasdeontem.blogspot.com.br
         A.F. Monquelat
 
Coisas da polícia
Às duas horas da madrugada do dia 13 de fevereiro de 1884, dois praças da seção policial arrombaram a porta do botequim de Pedro Canderini, à Rua General Osório, e dali tiraram à força Gabriela Ferreira da Silva, inquilina daquela bodega, e a arrastaram para fora da cidade, “cevando nela seus instintos brutais”.
Nesta façanha, foi coadjuvante um ex-praça da polícia.
O proprietário do botequim ficou bastante machucado por ter-lhe caído sobre um pé a porta, na ocasião de ser arrombada.
Constava que, sabendo do ocorrido, o Sr. delegado de polícia mandou recolher ao xadrez os autores da façanha.
 
Padeiro espanhol, por causa de uma cocote, tenta o suicídio.
O fato foi noticiado como mais uma loucura e um crime provenientes das exigências do coração, dos devaneios da fantasia ou do desarranjo das faculdades mentais. Manoel Malhão, espanhol, 30 anos, profissão padeiro, entretinha relações amorosas com certa “deidade do mundo equívoco” com residência à Rua Santo Antônio [Miguel Barcelos]. (Este santo bem poderia ter evitado a desgraça se fosse mais milagrosamente casamenteiro.)
Viviam um para o outro e pareciam ter encontrado a suprema felicidade.
De repente... ela, por suas conveniências ou por qualquer outra circunstância, bateu a linda plumagem, como lá se dizia, deixando abandonado o quarto em que residia e entregando a chave ao seu proprietário.
Manoel deu pelo caso quando voltou para casa, no horário de costume.
Imaginem que de torturas, que de contrariedades, que de alucinações não sofreu Manoel ao ver deserto o ninho de seus amores.
Não hesitou um instante.
A paixão tem dessas resoluções extremas.
Muniu-se de uma porção de verde-paris [Verde-paris foi um dos primeiros "inseticidas" a ser utilizado. Ele é lembrado como um dos exemplos mais emblemáticos de um inseticida sintético inorgânico, e tem uma história bastante peculiar] e de uma garrafa de cachaça.
Saltou o muro dos fundos da casa onde gozara de seus gratos instantes de felicidade, sentou-se ao portal do quarto, que pertencera à fugitiva, e, para vingar-se dela, do seu desprezo, ingeriu o verde-paris e a cachaça também.
Tudo isto aconteceu por volta da meia-noite do dia 18 de fevereiro de 1884, quando a lua despontava no firmamento.
Pobre e infortunado Manoel.
Que tormentos não passou no terrível instante de sentir a vida resvalar pela vala comum.
Não era, porém, chegada a sua hora, como diria um fatalista.
A cachaça salvou-o pois é um excelente contra veneno.
Dia 19, pela manhã, foi encontrado quase morimbundo.
O delegado de polícia soube da ocorrência e o mandou transportar à Santa Casa de Misericórdia.
Talvez escapasse da morte, embora fosse grave o seu estado.
Se assim acontecesse, comentava o jornalista, seria mais um mártir do amor e menos uma vítima das cocotes [prostitutas].
No bolso do Sr. Malhão, foi encontrada a seguinte carta, dirigida a ele mesmo: “Sr. Manoel Malhão. Peço desculpas a meus amigos e conhecidos, e às Sras. Autoridades [peço que] não tomem conta nisto porque, talvez, com o positivo será encontrado morto ou vivo, envenenado pela minha própria mão. Peço desculpas à autoridade, e que não faça caso nenhum, donde quer que eu seja achado. Pelotas, 18 de fevereiro de 1884”.
 
Preta, louca, seminua, obscena e vagabunda
Aos 14 dias do mês de março de 1884, o jornalista do A Nação chamava a atenção do Sr. Delegado de polícia para uma infeliz “preta louca” que percorria as ruas da cidade, seminua e proferindo obscenidades, inconsciente do que fazia.
Além de dar-se diariamente um “espetáculo repugnante” perante o público, excitava a compaixão pelo seu miserando estado.
Condoesse-se também dela a autoridade, providenciando, de modo a fazer cessar “a vagabundagem da infeliz alienada”, e prestaria assim um serviço à moralidade pública.
 
Rolo na bodega da Rua General Osório
O jornal A Nação de 23 de maio de 1884 chamava a atenção do Sr. delegado de polícia para diversas bodegas da Rua General Osório, onde continuamente se davam distúrbios, com grave ofensa da moralidade pública.
Ainda na noite do dia anterior houve forte baderna numa daquelas bodegas, e, depois de grossa pancadaria ficou gravemente ferido, com uma facada, um indivíduo que se opôs a que um tal João Alfaiate esfaqueasse uma meretriz que morava na tal bodega.
Não convinha que em uma cidade como Pelotas repetissem-se diariamente aquelas cenas, por isso o jornal apelava para o Sr. major Caldeira, esperando que este, com toda a energia, pusesse um fim a tantos desmandos.
 
Cenas escandalosas
Alerta Sr. Major Delegado de polícia e tome providências para obstar a repetição das cenas vergonhosas que estavam acontecendo na Rua Gonçalves Chaves, promovidas pela meretriz Amélia da Cunha.
As certas horas da noite agrupavam-se à porta daquela mulher alguns rapazolas e começava o tiroteio de obscenidades, provocados por Amélia da Cunha.
A bem da moralidade pública e em atenção às respeitáveis famílias que moravam nas proximidades daquele local, pedia o jornalista do A Nação ao Sr. delegado de polícia que pusesse fim a tais desmandos.
 
Atenção para as imoralidades no antigo salão da Bixa
O jornalista do A Nação, dia 23 de junho de 1884, chamava a atenção da autoridade policial para o fato de os proprietários do antigo salão da Bixa, à Rua São Jerônimo [atual Marechal Floriano], estarem programando bailes na sexta e sábado apesar de não terem obtido licença da autoridade.
Sabia o jornalista que para iludirem aquela formalidade, os bailes teriam o caráter de particulares, mas as entradas seriam cobradas dentro do salão.
Para isto, chamava a atenção do Sr. Major Delegado de Polícia que, sem dúvida alguma, não quereria desaprovar publicamente o ato de moralidade praticado pelo seu digno suplente, o Sr. tenente Alves Guimarães que, atendendo às reclamações da imprensa, cassou terminantemente as licenças concedidas para aqueles bailes, “verdadeiros focos de imoralidade”.
 
Samba na bodega do porto
Na noite de 3 de agosto de 1884, houve um samba [desordem, bagunça] numa bodega do porto da cidade; onde costumavam reunir-se mulheres de “má vida” e ébrios, que ali praticavam cenas da mais desenfreada devassidão.
Da desordem, resultou sair ferido, com uma facada, um praça de linha, que fazia parte da guarda da Mesa de Rendas, e que acudira em defesa do dono da bodega.
O autor do ferimento foi um marinheiro conhecido por João Algarvio.
O jornalista do A Nação chamava a tenção da polícia para aquela locanda [bodega, taberna, tasca].
                   Continua...
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* Extraído do livro, ainda inédito, A princesa do vício e do pecado
Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública Pelotense-CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen