quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Alguns aspectos históricos sobre o porto de Pelotas (3)


                                                                                     A.F.Monquelat

Ruptura de um caixão de concreto

         Ao final da tarde do dia 11 de março de 1936 um dos caixões de concreto com os quais estava sendo construído o cais desta cidade sofreu uma ruptura .
         Em face desse acidente, foi por água abaixo grande parte do aterro que estava sendo feito, em uma largura de 40 metros, mais ou menos, entre o antigo e o novo cais.
         As causas que determinaram a ruptura do caixão de concreto, segundo o engenheiro Sommeregger, sob cuja direção estavam as obras, somente seriam possíveis conhecer quando fosse retirado completamente o aterro e examinado o caixão, assim como o lastro sobre o qual este repousava.
         Entretanto, uma das causas poderia ter sido o próprio lastro onde estavam assentados os referidos caixões.
         Esse lastro era feito de pedra bruta, numa altura de dois a dois e meio metros, sendo possível que, ao receber o peso do aterro, o caixão rompesse em virtude da diferença de compressão.
         Segundo informações dadas pelo engenheiro responsável, as obras ofereciam a máxima garantia, porquanto as suas bases foram calculadas pelos próprios engenheiros da Diretoria de Obras Públicas do Estado, portanto não haveria razões para modificar o traçado das obras. Elas seriam executadas de acordo com o projeto original
         Acrescentou o engenheiro Sommeregger que acidentes daquela natureza eram comuns em obras hidráulicas de grande porte, citando a seguir acidentes de maiores proporções ocorridos nas obras do porto de Paranaguá e Ilha das Cobras.
         No dia seguinte ao acidente, foram iniciadas as obras de construção do novo caixão de concreto, que deveria substituir o que fora inutilizado..
        O ritmo dos trabalhos de dragagem, como todos os demais trabalhos continuavam normalmente, não tendo sofrido interrupção alguma.
         O caixão que iria ser substituído media 20 metros de comprimento.
         Os prejuízos causados pelo acidente foram calculados entre trinta e quarenta contos de réis.
         Dentro de 30 dias, mais ou menos, estariam concluídos e entregues à atracação de navios os primeiros 80 metros de cais, partindo da Estação Fluvial.
         Concluía a reportagem que, baseados nas informações prestadas pelo engenheiro Sommeregger sobre a solidez do novo cais de Pelotas, as obras estavam sendo fiscalizadas por competentes engenheiros do Estado.

Os vapores do Lloyd Nacional não escalariam mais no porto de Pelotas

         Em face da notícia divulgada dia 17 de junho de 1936, pela manhã, de que o Lloyd Nacional suspendera escala de seus vapores pelo porto de Pelotas, a reportagem de A Opinião Pública procurou ouvir a respeito o Sr. José Aníbal Madureira da Costa, agente daquela companhia nesta cidade.
         O Sr. Madureira, na ocasião, declarou ter recebido um telegrama, dando-lhe aquela notícia, mas que havia telegrafado para o Rio de Janeiro querendo saber as causas que provocaram aquela decisão.
         O Sr. José Costa solicitou também, à diretoria do Lloyd Nacional, fazer escalar no porto de Pelotas, aquela semana, conforme já fora anunciado, o Aratimbó, que estava atracado no porto da capital do Estado, e que por Pelotas deveria passar dia 19 daquele mês, pois já havia muita carga designada para o referido vapor conduzir aos portos do norte.

         O Sr. Costa lamentou à reportagem a medida tomada pela sua representada.
         Por outro lado, informava também o jornal, que essa deliberação já era esperada, pelo que se ouvia dos comandantes e demais pessoal de bordo dos navios do Lloyd Nacional, justificando-se que, pela sua navegação a motor, era impossível continuar a atracarem em Pelotas, visto o novo porto ter estreitado o canal São Gonçalo.
         Além disso, segundo informações obtidas pela reportagem, esses navios durante o tempo que permaneciam no porto de Pelotas, despendiam uma despesa expressiva.



Lloyd autoriza o vapor Aratimbó aportar em Pelotas

         Como já havia muita carga destinada aos portos do Norte do país, e para ser transportada pelo Aratimbó, que por aqui deveria passar dia 19 de junho de 1936, foi telegrafado à agência, no Rio de Janeiro, pedindo não tornar efetiva a resolução dos vapores do Lloyd de não mais atracarem no porto de Pelotas, quanto àquele vapor, nessa viagem.
         Dia 18 de junho, foi divulgado que o Aratimbó, oriundo de Porto Alegre, receberia carga, já depositada no porto de Pelotas.
         Quanto à continuidade da navegação dos vapores do Lloyd Nacional, neste porto, estavam sendo tomadas as providências que fizessem com que a companhia desistisse daquela decisão, que tantos prejuízos causariam ao comércio exportador da praça de Pelotas.

A chegada, a saída e a possível causa dos “Aras” não mais atracarem no porto de Pelotas

         Conforme noticiado fora, o Aratimbó atracou no porto de Pelotas, fazendo assim, conforme resolução do proprietário, sua última viagem a Pelotas.
         Como até aquele momento ninguém sabia, nem mesmo o agente do Lloyd nesta cidade, Sr. José Aníbal Madureira, a causa principal da resolução dessa medida que tão grande surpresa causara ao comércio exportador local, esteve a bordo do Aratimbó horas depois de sua atracação, alguns jornalistas da imprensa pelotense, conversando com o comandante do navio, Sr. Jorge Nobre, que disse a eles nada saber de positivo, ignorando por completo o motivo pelo qual o Lloyd Nacional tomara aquela medida de suspender a navegação, não só  Aratimbó, mas de todos os “Aras” daquela companhia no porto de Pelotas.
                                                                 
                                                                                                                                                                                                               Continua...
 

___________________________________________________        
Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública Pelotense-CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen      
Foto:  Acervo digital do autor.       
Seleção de imagem: Janaína Vergas Rangel        

quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Alguns aspectos históricos sobre o porto de Pelotas (2)


                                                                                     A.F.Monquelat

A localização do cais

         Pelo projeto geral, o cais a ser construído partiria das imediações do antigo estaleiro Lima, avançando até o Mercado do Porto, então existente na Praça Domingues Rodrigues, abrangendo uma extensão de 460 metros.
         Em janeiro de 1934, mês em que o governo do Estado aprovou os detalhes do projeto dos caixões [blocos], modificou-se também o traçado do cais, forçado que foi pelo fato dos proprietários dos velhos trapiches e outros imóveis a serem desapropriados, pretenderem pela venda dos mesmos quantias superiores aos seus valores reais.
         Em vista disso, foi resolvido suprimir o alinhamento reto de 280 metros, que partia do estaleiro Lima, abrangendo todos os trapiches, e adicionar mais 260 metro sobre o prolongamento para jusante [ lado em que segue o curso de água; lado em que vaza a maré.] do segundo alinhamento reto de 18 metros, dando assim ao novo cais uma extensão total de 440 metros.
         Assim sendo, desenvolver-se-ia a construção de acordo com o novo traçado, com início nas imediações da velha escada de desembarque, prolongando-se até as proximidades da Estação Fluvial.
         A sua diretriz ficaria equidistante da Avenida em 65 metros, o que significava dizer que, a construção avançaria sobre o canal São Gonçalo, em 40 metros, mais ou menos além da estacada existente, e o vazio que ficaria entre a nova e a antiga construção, que seria aterrada com o produto da dragagem, que seria realizada no leito do Canal.
         Desde o mês de fevereiro de 1934 que a firma vinha praticando sondagens geológicas no leito do São Gonçalo, com a intenção de conhecer a natureza do material que o constituía, não somente com o objetivo de avaliar sua resistência, para o assentamento dos blocos de concreto armado, como para a avaliação do volume a ser dragado, na profundidade de 6 metros, conforme exigência contratual.



Pessoal técnico

         Em visita realizada pela Imprensa local ao amplo prédio da firma Costa & Boegh, localizado à Rua General Osório nº 615 (sobrado), onde se encontravam localizados os escritórios e os departamentos técnicos da empresa, foi constatado serem estes constituídos por amplas salas, várias pranchetas e mesas para cálculos, além do gabinete do engenheiro-chefe, Sr. Dr. Carlos Boegh.
         O quadro do pessoal técnico da firma compunha-se dos seguintes engenheiros: Carlos Boegh, engenheiro-chefe, Emílio Iost, Pedro Sproviero, Rodolpho Sommeregger, Carlos Du Pasquier Júnior, Wilhelm Glasser, Gunter Glasser; e mais três desenhistas.
         Sob a direção do engenheiro Carlos Boegh, esses engenheiros tinham ocupações determinadas e empregavam a sua atividade na seção de cálculos, desenhos e trabalhos externos.
         A direção geral da firma estava a cargo do sócio, Sr. Antônio Edgar Costa, que era natural de Pelotas e fora sócio fundador e diretor da firma Kemnitz & Cia., construtora da ponte internacional sobre o rio Jaguarão e outras importantes obras de engenharia realizadas em diversos pontos do país.
         Era oportuno lembrar, segundo um jornalista que acompanhou a comitiva, que a construção do porto de Pelotas, “cuja necessidade vinha, de há muito, se fazendo sentir”, era devido ao esforço e a tenacidade de dois pelotenses: o Dr. João Py Crespo e o coronel Joaquim Augusto de Assumpção.
         O primeiro, Sr. Dr. João Py Crespo, quando intendente deste município, lançara a ideia da construção do porto, e, ao coronel Joaquim Augusto de Assumpção, então prefeito, pusera em prática a ideia do seu antecessor.

O telegrama da Associação Comercial de Pelotas ao general Flores da Cunha

         A Associação Comercial de Pelotas dirigiu, dia 4 de setembro de 1935, ao general Flores da Cunha o seguinte telegrama:
         “Exmo. Sr. general governador do Estado.
         Constando aqui que o governo do Estado encampou a construção do porto local, esta Associação interpretando o pensamento do comércio e da indústria desta zona sul do Estado, pede vênia a V. Excia. para renovar a exposição do seu ponto de vista acerca das desvantagens que, consequentemente, advirão para a vida econômica de Pelotas se, no momento, o projeto dessa vultosa obra for executado, integralmente, com caráter de porto oficializado e organizado.
         Pelotas, como V. Excia. conhece, não conta ainda com elementos suficientes para garantir ao novo porto um movimento de grande tonelagem, proporcionalmente ao elevado custo da obra, de sorte que, computados os valores invertidos e as despesas inerentes ao funcionamento respectivo, adviriam taxas portuárias superiores às dos demais portos do Estado ficando, portanto, Pelotas, embora seja ponto de convergência da importação e da exportação dos municípios limítrofes, poderá manter um movimento anual de cerca de oitenta mil, garantindo, portanto, uma renda muito pequena para permitir as mesmas taxas cobradas em P. Alegre e Rio Grande.
         Como porto secundário, desde que passassem a vigorar as despesas a que ficariam sujeitos todos os valores de Navegação Costeira e as embarcações que fazem o tráfego lacustre e fluvial, Pelotas sofreria grandemente no seu movimento, dando lugar a restrições das principais linhas, e a supressão de outras, Pelotas como medida de saneamento e de estética, precisa apenas de um cais e, esta Associação, refletindo o pensamento daqueles que conhecem os grandes problemas econômicos de Pelotas, sempre combateu a ideia da construção de um porto organizado, fazendo sentir que esse empreendimento deveria ficar limitado a um cais. E agora, quando se proporciona a rescisão do contrato respectivo, novamente ousamos ponderar a V. Excia. o mesmo ponto de vista que sempre sustentou esta Associação, longe de qualquer sentimento interesseiro, mas inspirado unicamente pelo são desejo de evitar um colapso de consequências gravíssimas para a atividade das classes produtoras e especialmente para o seu comércio de importação e de exportação. Ante a eventualidade da encampação das obras, ousamos sugerir a V. Excia. Que seria oportuníssimo o momento para mandar revisar o projeto existente, restringindo-o a um cais somente e, afastando definitivamente o plano de porto organizado que, por outro lado, traria encargos não reprodutivos para o Estado.
         E já que está votada e autorizada a verba para a construção total, permitimo-nos sugerir que a sobra resultante da restrição do projeto seja aplicada na reforma e na consolidação das duas importantes estradas intermunicipais, Pelotas ao Vale do Camaquã, passando por São Lourenço, e Pelotas a Piratini, passando por Canguçu; a primeira seria início de uma grande e necessária artéria, ligando o sul do Estado a Porto Alegre. Executado este plano rodoviário: Pelotas, Canguçu, Piratini, Camaquã, São Lourenço, Arroio Grande e outros seriam consideravelmente beneficiados e facilitar-se-ia o desenvolvimento das zonas cujo progresso depende exclusivamente da eficiência dos meios de transporte.
         A nossa sugestão encerra um problema de vital importância para esta zona sul do Estado e seria de fácil execução, sobretudo porque não demandaria sacrifícios por parte do governo, já que a verba destinada à construção do porto está computada no orçamento vigente, podendo ser aproveitada no plano das estradas o Batalhão Rodoviário da Brigada, cujos magníficos trabalhos mereceram sempre os mais justos aplausos.
         Confiantes em que esta exposição merecerá de V. Excia. todo o interesse que lhe tem merecido os grandes problemas econômicos do Estado, apresentamos nossos respeitosos cumprimentos e antecipamos-lhe nossos agradecimentos.   
         Associação Comercial – Manoel Ferraz Vianna, presidente; Victorino Menegotto, secretário”.

                                                                                              Continua... ________________                                     
Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública Pelotense-CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen      

Seleção de imagem: Bruna Detoni

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Alguns aspectos históricos sobre o porto de Pelotas (1)



                                                                                
                                     

                                  
   Pelotas é uma dádiva do São Gonçalo”
                                               Jorge Salis Goulart


        
         A paródia cunhada pelo sociólogo Jorge Salis Goulart sobre a cidade de Pelotas é, em nosso entender, uma premissa parcial à qual podemos acrescentar que: Pelotas é uma dádiva do canal São Gonçalo, da escravidão e do charque.
         Considerando não ser este o tema de nosso trabalho, não trataremos aqui de tal acréscimo, e sim das obras do porto de Pelotas no São Gonçalo.

 As obras do porto de Pelotas e o martelo de bronze e prata

         Em reunião realizada dia 11 de outubro de 1933, uma semana após a assinatura do contrato entre o governo do estado e a empresa acertada para a construção do porto de Pelotas, os “acadêmicos do comércio”, em uma das salas da Escola Prática, resolveram homenagear o general Flores da Cunha, por ocasião de sua próxima visita a Pelotas.
         Constaria a homenagem do oferecimento a S. Exa, de um martelo de bronze, com cabo de prata, para bater a estaca que marcaria o início das obras do porto de Pelotas.
         Essa proposta, unanimemente aprovada, foi apresentada pelo presidente do Grêmio Acadêmico, Sr. Mário Gastaud de Oliveira.

O início das obras

         A primeira das dificuldades encontradas pela empresa contratada para a construção do novo porto de Pelotas foi a mudança de local em princípio escolhido e onde seria o porto construído.
         Essa mudança, que por certo ocasionou novas sondagens, novos estudos e diferentes projetos, ocorreu pelo fato dos proprietários dos antigos trapiches existentes no porto da cidade, bem como outros proprietários de imóveis a serem desapropriados pelo Estado, pretenderem pela venda dos referidos bens quantias exageradas, até mesmo fabulosas.
         A lista de obstáculos enfrentados pela firma Costa & Boegh, com o intuito de fazê-la fracassar, com relação a construção do porto de Pelotas foram muitos, um deles no entanto é muito expressivo, pois, pretendendo a empresa  fazer, no parque da construção, instalação de força elétrica, solicitou orçamento para essa obra à Light & Power. Esta última, que sempre se mostrava pouco disposta para com as reivindicações do povo pelotense, pediu em torno de 20 contos de réis para estender fios em uma distância, de mais ou menos, cem metros.
         O valor proposto pela Light foi considerado absurdo e, é claro, a Costa & Boegh viu-se obrigada a adquirir, por compra, um locomóvel [máquina a vapor automotora usada para movimentar cargas ou para fornecer energia em locais determinados] para solucionar o problema.
         Todos esses fatores, dos quais o público não tinha conhecimento, ocasionaram perda de tempo e acréscimo de despesas à firma contratante.
         Porém, a despeito de tudo, o respectivo contrato, assinado a 5 de outubro de 1933, entre o Estado e Costa & Boegh, para a construção do porto de Pelotas, vinha sendo fielmente cumprido, inclusive quanto à data a qual se referia o documento, para o início das obras, que era a de 30 dias após a data da assinatura, o que foi feito, tendo sido desembarcado em Pelotas, grande quantidade de material de diversas procedências.
         Como até o início das obras ainda não houvesse sido nomeado o respectivo fiscal representante do governo, foi lavrada, perante “pessoas de reconhecida idoneidade”, uma ata provisória do início dos trabalhos.
         Somente a 20 de novembro, recebeu a firma Costa & Boegh comunicação oficial de haver sido nomeado fiscal, junto às obras do porto, o engenheiro Sr. Dr. Antônio Pradel.

Vista aérea do Porto de Pelotas


Os detalhes técnicos das obras

         Segundo o projeto do engenheiro Carlos Boegh, engenheiro chefe e membro da firma construtora, projeto aprovado pelo Sr. Secretário das Obras Públicas do Estado, toda a construção seria feita de concreto armado, constituída por 22 caixões [blocos] independentes de 20 metros de comprimento, 8.76 de altura e 4.70 de largura, com o peso unitário de 161 toneladas.
         Esses caixões, uma vez construídos, iriam formar a muralha do cais, propriamente dito.
         Tal construção, entretanto, não poderia ser feita no local definitivo, mas sim em terra firme, em local previamente preparado, constituindo um dique seco, exigindo movimento de terra que alcançaria um volume aproximado a 10.000 metros cúbicos de “difícil extração”, em virtude não somente de sua natureza, como também das constantes cargas de água que naquele mês de março, estavam caindo, prejudicando assim, e muito, o andamento normal do trabalho.
         A escavação estava sendo feita até a cota de 2.23 metros abaixo de zero da escala marítima, e estaria por aqueles dias, em vias de conclusão, bem como o avançamento dos moldes sobre o concreto, que prosseguia em rápido progresso.
         Depois de concluído aquele trabalho preliminar, seria dado início à construção dos caixões do dique, os quais, assim que construídos, flutuariam no próprio dique, com a entrada das águas do canal, e dali sairiam rebocados para serem colocados, definitivamente, “na linha locada do futuro cais”.
         Logo o trabalho mais árduo e mais demorado estava sendo totalmente efetuado em terra firme, exigindo tempo determinado para ser ultimado na sua totalidade.
         Aliás, se o cais fosse construído em estacas de cimento, ou mesmo em blocos de concreto, o problema inicial de construção seria o mesmo, isto é, o trabalho seria feito todo em terra, como no caso dos caixões estava sendo feito e, quer num quer noutro caso, qualquer firma contratante não poderia construir o cais, sem o trabalho preliminar que cada um daqueles vários processos exigia.
         Na visita que a imprensa fez ao local da construção, na época, tiveram a oportunidade de constatar que trabalhavam, nas obras do porto de Pelotas, 180 homens, em média, entre trabalhadores, capatazes, carpinteiros, ferreiros e maquinistas.
         Até o mês de fevereiro de 1934, as folhas de pagamento do pessoal operário atingiam, aproximadamente, a 60.000$000 [contos de réis], conforme fora mostrado pelo contabilista da empresa.
         Além dessa despesa, ainda deveria ser levado em conta o pessoal que trabalhava nas pedreiras, nos areais, nos transportes dos diversos materiais e, ainda que muitos recebiam indiretamente, não deixava a firma construtora de despender quantia bem expressiva com tais serviços.
                                               
                                                                                                                                                                Continua...



___________________________________________________        

Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública Pelotense-CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen      

Foto:  Daniel Giannechini       

sexta-feira, 9 de setembro de 2016

A Pensão Biarritz


         A.F.Monquelat




Uma mulher é quase degolada na Pensão Biarritz

         A Pensão Biarritz, situada à Praça 7 de Julho [Andrade Neves quase em frente às antigas Bancas do Peixe], foi, dia 17 de dezembro de 1935, à noite, teatro de violenta cena de sangue, que poderia ter causado a morte de uma mulher, a qual, entretanto, recebeu extenso ferimento produzido por navalha.
         Um breve romance de amor, interrompido bruscamente pela ausência da “nota” [dinheiro], foi a causa da cena que a imprensa de Pelotas narrou naquela data, baseada nas declarações da vítima prestadas, no mesmo dia, na Delegacia de Polícia.
         Silvina Garcia, de 19 anos de idade, branca, casada e residente na Pensão Biarritz, há cerca de três meses, tropeçou em seu caminho, com Santiago Pinheiro, de 22 anos de idade, branco, solteiro e de profissão chofer.
         Do acidente, resultou ambos, após a tradicional troca de olhares, seguida de melosas declarações de amor eterno, entrarem em entendimento.
         A vida seria talvez pensassem eles, dali para frente, um mar de rosas.
         E assim, construíram seu ninho de amor na cidade de Rio Grande, onde viveriam a contar estrelas, sem outras preocupações que não as de se amarem eternamente...
         Mas, e a “nota”, esse elemento indispensável para garantir a felicidade no amor?
         Dessa fundamental particularidade se esquecera completamente Santiago, e foi justamente esse esquecimento que provocou a fissura entre os amantes.
         No princípio, Silvina ia levando a vida sem o auxílio monetário do amante, mas depois essa situação tornou-se insustentável e, em consequência, seu coração congelou. Resolveu ela, então, no dia anterior ao acontecimento, retornar a Pelotas, hospedando-se na Pensão Biarritz.
         Com a decisão, porém, não se conformou Santiago, que resolveu então ir “chorar suas misérias”, ao ouvido da indiferente Silvina.
         Eram 20h30, quando ele foi bater à porta do quarto de sua ex-amante. Esta atendeu, e Santiago desfiou um enorme rosário de razões na esperança de convencer Silvina a voltar ao ninho antigo.
         Faltava-lhe, entretanto, a razão mais forte e de maior poder convincente, isto é, “a nota”.
         E, em vista disso, Silvana lhe respondeu: jamais.
         Santiago tentou outras razões que, às vezes, dão ótimos resultados nesses meios onde ele pretendia reinar: esmurrou Silvina...
         Silvina, porém, apavorada diante da perspectiva de “amar” sem dinheiro, gritou por socorro.
         O amante desprezado, vendo frustrados seus argumentos, concebeu a ideia de matá-la ou, pelo menos, deformá-la para sempre e, sacando do bolso uma navalha desferiu em Silvina violento golpe.
         Silvina, num instinto de defesa, procurou fugir, em virtude do que foi atingida na parte posterior da cabeça.
         Nesse ínterim, acorreram várias pensionistas da Pensão Biarritz, que avisaram o 1º posto policial o que estava ocorrendo.
         A polícia compareceu imediatamente, lavrando o flagrante e prendendo o criminoso.
         Silvina Garcia foi conduzida no automóvel da Assistência à Santa Casa, onde recebeu curativo.
         No mesmo dia, na Delegacia de Polícia, foram ouvidos os protagonistas da cena de sangue e testemunhas, para que fosse instaurado o competente processo.
         E teve assim um sangrento epílogo um terno romance de amor, concebido sob a frágil base: “O teu amor e uma cabana”...

Henri de Toulouse-Lautrec

Hotéis ou Pensões?

         Aos 3 dias do mês de fevereiro de 1936, o jornal A Opinião Pública publicava em suas páginas um caso que se observava nesta cidade e estava por merecer especial atenção das autoridades policiais.
         Queria o jornal se referir aos antros de lenocínio, conhecidos vulgarmente por Pensões, algumas das quais, as mais luxuosas, como se via, ostentando pomposos títulos à capa de hotéis.
         Essas últimas gozavam de inexplicável consideração das autoridades policiais, consideração essa e que se devia por imediatamente um fim.
         Eram casas localizadas nos pontos mais centrais de Pelotas e onde, até altas horas da madrugada, tocava-se, dançava-se, cantava-se e berrava-se, sem o menor respeito pelo sossego público.
         Acrescia a circunstância de que, não raras vezes, a tranquilidade da vizinhança era perturbada por badernas que cessavam apenas com a intervenção da polícia.
         Havia ainda um fato mais grave: essas casas de tolerância eram também frequentadas por menores e até por colegiais.
         E isso era simplesmente lamentável e não podia, nem deveria, continuar.
         O assunto era por demais complexo para ser tratado naquele resumido espaço, dizia o jornalista. Entretanto, o que não deixava dúvida era que essas denominadas Pensões ou deveriam ser extintas definitivamente ou ser afastadas do centro da cidade para que, desse modo, fosse a população poupada de toda a sorte de espetáculos atentatórios à moral e aos bons costumes.
         Além disso, era preciso proibir, terminantemente, a entrada de menores nesses antros.
         Isso, como medida inicial porquanto a localização do meretrício, em geral, deveria merecer, em Pelotas, o mesmo especial cuidado que estava merecendo em todos os centros civilizados como, naquele momento, em Porto Alegre.
         Mas essa localização deveria ser feita imediatamente, tratasse-se de antros limpos ou sujos, pois, no fundo eram todos iguais.



Da próxima vez, publicaremos os nomes...

         Ainda no dia anterior, segundo o jornalista, pela madrugada, verificara-se tremendo sururu na pensão denominada Hotel Biarritz, localizada à Rua Andrade Neves [Praça 7 de Julho], defronte à Banca do Peixe, no Mercado Central, o que veio ainda mais uma vez comprovar os graves inconvenientes de tais casas.
         Seriam 3 horas da madrugada, quando o Sr. tenente chefe do policiamento, após visitar os postos policiais, dirigiu-se ao Hotel Biarritz, no intuito de ver se algo ali se passava de anormal.
         Logo de chegada, esse oficial foi surpreendido pelo seguinte fato: um sargento e um policial haviam dado voz de prisão a dois rapazes que se portavam inconvenientemente.
         Esses rapazes disseram que não se entregariam à prisão e mostravam-se dispostos a resistir.
         O oficial, no propósito de evitar um conflito, mandou que seus subordinados se retirassem e convidou os dois rapazes a acompanhá-lo até o 1º posto policial.
         Os rapazes em questão, sem resistência alguma, foram até o 1º posto, onde ficaram aguardando a chegada do delegado de polícia, que fora chamado para solucionar o caso.
         O chefe do policiamento, retornou, então, ao Hotel Biarritz, pois notara que a sua presença era ali necessária, em virtude de já haverem muitos frequentadores embriagados.
         Logo que essa autoridade penetrou na Pensão, dois outros rapazes, companheiros dos dois primeiros, começaram a dirigir provocações ao oficial e, como esse retrucasse, foi por eles agredido a socos.
         O chefe do policiamento, usando de um pinguelim [espécie de chicote fino e comprido usado por cocheiros], produziu leves ferimentos em seus agressores, recebendo também dois ferimentos contusos na cabeça.
         Os agressores foram levados ao 1º posto policial.
         Dizia o jornalista que somente em consideração às famílias dos promotores dessa desordem deixava de publicar-lhes os nomes.
         Entretanto, concluía o jornalista, como tais fatos se repetiam com grave dano à tranquilidade e ao decoro social, a reincidência o faria mudar de ideia, uma vez que os autores de semelhantes cenas, eram os primeiros a menosprezar os nomes de que eram portadores.
                 
        
_________________________________________________    
Fontes: acervo da Bibliotheca Pública Pelotense - CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen



sexta-feira, 2 de setembro de 2016

No cabaré do Biriba


         Entre os diversos cabarés que Pelotas conheceu dentre as décadas de 10 e 30, um deles frequentou, por diversas vezes as páginas policiais naquele período: o célebre cabaré do Biriba, localizado à Rua Tiradentes nº 14, próximo ao pontilhão.

Josephine Baker

  
       A grande atração deste cabaré era a mulher Alayde Goulart da Silva, uma parda simpática e que dançava tal qual a famosa bailarina Josephine Baker [Saint Louis, USA, 1906 – Paris, França, 1975] tida como a primeira grande estrela negra das artes cênicas, sendo Alayde, por isto, considerada a “étoile” do petit-cabaret do Biriba, instalado sem conforto nem higiene, segundo a imprensa, nas proximidades do pontilhão da Rua Tiradentes.
         Alayde, dentre as demais estrelas da casa, era a que mais admiradores tinha no “desordenado antro noturno”, motivo pelo qual ela desfrutava a admiração e atenções do Jorge, “robusto” carneador da charqueada São Gonçalo e do pescador Isidro Miranda.
         Na noite do dia 4 de abril de 1928, os dois rivais se encontraram no local de apresentação de sua idolatrada e se digladiaram pela posse do amor de Alayde.
         Da luta renhida, o pescador Isidro teve o braço direito cortado por um golpe de adaga que Jorge lhe desferira, fugindo em seguida.
         Benedicto Braga,cidadão que atende pelo alcunha de Biriba e o diretor-proprietário do minúsculo Folies Bergères, avisou a polícia e enviou o ferido para a Santa Casa, onde ficou recolhido.
         Na delegacia de polícia, o Sr. capitão Orestes da Fonseca, no dia seguinte, escutou o “Biriba” e a “fascinante” Alayde Goulart da Silva.

Os bambas promovem algazarra no cabaré do Biriba

         Dia 17 de fevereiro de 1930, à noite, deu-se forte algazarra no cabaré do Biriba, próximo ao pontilhão da Rua Tiradentes.
         Chamada a Guarda Civil, esta conduziu para as grades do 2º posto, os seguintes turbulentos: Mário Maciel, João da Cruz Freitas, Maria Cândida Teixeira, José Aram, Maria Souza, Casemira Gouvêa, Alaíde Silva, Antônio Alves, Julieta dos Santos, João Francisco de Moraes e Maximiano Britto.

Cena de sangue no “Cabaré do Biriba”

         Na conhecida “espelunca” situada à Rua Tiradentes nº 14, denominada “Cabaré do Biriba”, deu-se, na madrugada do dia 3 de dezembro de 1930, por um mal entendido, uma cena de sangue, saindo ferido um soldado do 2º batalhão do 9º R.I., aqui sediado.
         Cerca da 1h30, Waldemar  Silva, de 20 anos, solteiro, praça daquela unidade do exército, foi ao “Cabaré do Biriba” e, como encontrasse a porta fechada, bateu fortemente.
         Biriba, dono do estabelecimento, supondo que a casa estivesse sendo assaltada por gatunos, deu um tiro de revólver, em direção à porta, ferindo o visitante.
         Com o estampido, compareceu a polícia, prendendo Benedicto e fazendo com que o soldado fosse conduzido à Santa casa de Misericórdia, para ser medicado.
         A polícia abriu inquérito a respeito do caso.

Desordem no cabaré

         Uma formidável desordem, praticada por Adebar Farias Pinto, dia 15 de novembro de 1931, à noite, no “Cabaré do Biriba”, à Rua Tiradentes, custou-lhe nada mais, nada menos do que ser engavetado numa das celas do 2º posto.


Josephine Baker