sexta-feira, 19 de agosto de 2016

No mundo dos cortiços, (becos e corredores) de Pelotas (2)


                                                                                                         

                                                                                                          A.F.Monquelat



         Dando continuidade ao nosso trabalho sobre o mundo dos cortiços, e a origem de grande parte de seus moradores, destacamos aqui a matéria veiculada no Correio Mercantil de 17 de janeiro de 1888, sob o título de Assuntos do dia, na qual era dito que: “Contra a nossa expectativa e contra todas as convenções estabelecidas, têm dado nestes últimos dias algumas fugas de contratados dos estabelecimentos industriais desta cidade”.
         Um destes estabelecimentos, dizia o jornalista, o do Sr. Brutus Almeida, sem dúvida o mais importante em seu gênero, era o que por esse lado tinha sofrido maiores consequências e prejuízos, perdendo em menos de cinco dias vinte trabalhadores libertados “recentemente sob condição de serviços”.
         Este fato, além de outras fatais consequências, produzia sérios embaraços na marcha do trabalho e poderia ocasionar a paralisação do serviço industrial.
         Por mais abolicionista que fosse não poderia por forma alguma suportar em silêncio essa violação de contratos realizados em boa fé e sob a garantia de homens de confiança, dizia o redator do Correio Mercantil.
         Ainda sobre aquelas fugas voltava o Correio Mercantil, no dia 18 de janeiro de 1888, a informar que no dia anterior, “foram presos por particulares e polícias da Costa [do Arroio] e conduzidos para o estabelecimento industrial do Sr. Brutus Almeida, sete contratados do mesmo, dali fugidos”.
         E quanto ao 13 de maio de 1888 em Pelotas?
         Quanto ao 13 de maio, o jornal A Pátria, de 18 de maio de 1888, informava que o Centro Etiópico resolvera adiar para o dia 3 de junho, “quando termina a safra”, os festejos que estavam anunciados para o dia 27 de maio.
         O motivo de semelhante resolução claramente se depreendia do fato dos charqueadores terem nomeado uma comissão, entre si, e mandarem entender-se com o presidente do Clube Abolicionista, o Sr. Dr. Canabarro, afim de que ele, junto ao seu colega do Clube Etiópico, transferisse os seus festejos para um dos primeiros dias do mês de junho, visto estar acertado que os trabalhos das charqueadas findariam dia 31 daquele mês.
         No caso de os festejos populares ocorressem antes, contribuiriam muito em prejuízo dos fazendeiros da província e dos proprietários dos estabelecimentos industriais, pois as tropas em marcha à Tablada, que chegariam nos últimos dias daquele mês de maio, não poderiam ser disputadas e compradas se os charqueadores não contassem com braços para o serviço manual, porque, era de presumir que os 2.600 ex-escravos que iriam festejar “a aurora de sua liberdade”, não o fariam em menos tempo do que dois ou três dias.
         A partir da abolição, alguns órgãos de imprensa passaram a tratar, em especial aos ex-escravos como vagabundos e, para eles, chamarem a atenção das autoridades, como se pode ver pela notícia divulgada no jornal A Pátria, de 11 de junho de 1888, que fora informado “por pessoa fidedigna”, de que todas as noites reunia-se um número avultado de “homens de cor” na casa da Rua Santa Cruz, antiga moradia do Sr. tenente-coronel Brutus de Almeida, “atualmente desocupada”.
         Segundo o jornalista, esses indivíduos, sem eira nem beira, ali se reuniam e dali saíam, à noite, para praticarem todo o tipo de “roubos e tropelias”.
         Para tal fato, chamava o jornal a atenção da polícia.
         Enquanto isso, o major delegado de polícia ordenava “a muitos dos vagabundos” encontrados nos cortiços da cidade, que tirassem caderneta na câmara municipal e procurassem ocupação.
         Dia 14 de junho, voltava o jornal A Pátria a divulgar outra Revista nos casebres pelo Sr. delegado de polícia que, acompanhado do subdelegado de polícia do 1º distrito Sr. Pedro Batista Filho, do suplente Sr. Vicente José Ribeiro, comandante de polícia particular, escrivão e seis praças, continuando assim a percorrer os cortiços e casebres desta cidade no intuito de obrigar aos seus “inocentes” habitantes a munirem-se da respectiva caderneta e procurarem ocupação séria.
         O jornalista, para melhor informar aos leitores, acompanhou de perto as diligências.
         Notou ele que muitos “indivíduos vadios” possuíam a caderneta para “mais facilmente iludir a autoridade”, porquanto nelas nada continha por escrito que provasse o lugar onde trabalhavam e ao serviço de quem.
         A estes, advertiu a autoridade que, se fossem outra vez encontrados sem as declarações legais em suas cadernetas, teriam a correção conveniente.
         Outros, e nestes muitas libertas, disseram que em nada se ocupavam, pelo que foram imediatamente presas.
         Era incrível, dizia o jornalista, a quantidade de pessoas que moravam em “apertados e mefíticos [que tem cheiro repugnante, pestilento] corredores”, ainda divididos estes em seis e mais quartos. E acrescentava: “A imundície e a doença tem ali o seu império”.
         Merecia todos os louvores o Sr. delegado de polícia pela solicitude e energia que vinha praticando no empenho “de livrar a sociedade da ação dos vagabundos”.
         Ora, agora nos indagamos: terminada a safra das charqueadas, que outro destino teriam aqueles ex-escravos, que apenas conheciam outra atividade daquele mundo, despreparados e jogados ao abandono como ficaram, senão a de virem para a cidade?
         E a caçada aos “vagabundos” continuava, pois, dia 8 de julho de 1889, foram presas, e recolhidas ao xadrez da cadeia civil, “diversas mulheres de cor”, que, exercendo a profissão de criadas de servir, encontravam-se na vadiação há muito tempo e foram, pela polícia, encontradas em bailes públicos e orgias pela rua.
         Dia 10, foram as referidas mulheres, soltas e “entregues a diversos alugadores de seus serviços”, com a condição retornarem para a prisão se “voltarem à vidinha regalada”.
         Segundo o jornalista do Correio Mercantil, a polícia jurara não consentir na vagabundagem “que assolava a cidade”.


Esta imagem é meramente ilustrativa e não se trata de algum cortiço na cidade de Pelotas.


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Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública Pelotense-CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen       

3 comentários:

  1. adorei as matérias do blog Monquelat. Vou ficar fã, aliás já sou fã e com certeza ao ler, vou me inspirar nos teus escritos pra escrever o capítulo 3. Ótimo trabalho, parabéns!

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  2. Obrigado por tuas palavras AnaPaula, será um enorme prazer te ter seguindo o Blog, e tomara que te seja útil. Abraço.

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