(parte 3/4)
Policiais surram
cidadão embriagado
Na
madrugada do dia 22 de outubro de 1916, dois guardas da polícia administrativa
praticaram uma violência condenável, qual seja: o bárbaro espancamento, à
espada, de um cidadão que se achava em completo estado de embriaguês.
Semelhante
procedimento, dizia o jornalista, não poderia merecer a aprovação das
autoridades superiores, que, por certo, saberiam punir os atrabiliários policiais.
O
fato se passara no já famoso Salão Marly, onde acontecia um baile, no qual se
encontrava o cidadão Salvador Mendes, que, muito embriagado, portava-se de modo
inconveniente, provocando os demais convivas, a ponto de ser várias vezes
admoestado pela polícia que, por fim, o obrigou a sair.
Salvador,
que já se encontrava na rua, desrespeitou os policiais, que o tinham posto para
fora, razão pela qual lhe deram voz de prisão.
Salvador
ia sendo levado por dois guardas, até que, ao chegar à Rua Marechal Deodoro
esquina Tiradentes, surgiu uma alteração entre ele e os guardas.
Foi
o bastante para que os furibundos mantenedores da ordem desembainhassem as suas
espadas e aplicassem tremenda surra no cidadão, que apanhou bordoada de criar
bicho, pela cabeça, pelo corpo, etc.
Acossado
pela pancadaria, Salvador saiu em disparada pela Rua Marechal Deodoro fora,
sendo perseguido pelos dois guardas que lhe desfecharam dois tiros de revólver,
os quais erram o alvo.
Pouco
adiante caiu ele ao solo todo pisado e, neste estado, foi levado para o 1º
posto, onde ficou.
Como
Salvador chamasse por alguns conhecidos seus, pedindo-lhes a intervenção em seu
favor, os policiais ameaçaram os curiosos que haviam corrido, alarmados pelo
tinir das espadas, de lhes fazerem o mesmo serviço.
Concluindo,
dizia o jornalista não concordar com o método empregado pelos indivíduos a quem
estava confiado a manutenção da ordem.
Novas
atrações no Salão Marly
Segundo o jornal O Dia
de 27 de novembro de 1916, no sábado e domingo anteriores, houvera bailes no
popular Salão Marly e, como de costume, desenrolaram-se ali cenas impossíveis
de descrever, o que fez as famílias da vizinhança não dormirem a noite toda.
Ao
iniciarem-se as danças, no sábado,
uma senhorinha saiu para a rua, em
trajes masculinos, o que provocou muitas e alegres gargalhadas do pessoal escorreito
que frequentava o Marly.
A
festa daquela noite acabou com um tiro, que o jornalista presumia ter sido o
sinal para a debandada dos convivas, pois não era de crer que tivesse sido
disparado por efeito de algum conflito num salão onde reinava ordem e moralidade.
Dava
ele notícia daquela festa, para que a
polícia fosse assistir no próximo final de semana aos bailes no Marly; mas, era
conveniente que fosse uma ambulância, caso o tiro, sinal de dispersão,
acertasse em alguém.
Por causa de uma
mulher...
Há muito que João Alves da Silva, de 20
anos de idade, de profissão cocheiro, empregado na Cocheira Simões, era amásio
da mundana Tilinha da Silva, residente à Rua Tiradentes.
Por motivos de ciúmes, os dois amantes se separaram.
Anteontem, 31 de dezembro de 1916, Tilinha foi ao baile
público no Salão Marly, sito à Rua 7 de Abril, com o seu novo amante, Alexandre
Rodrigues Ferreira, garçom do Hotel do Comércio, sito à Rua Andrade Neves.
Ali chegados, e na ocasião em que estes dançavam, eis que
surge João Alves, ex-amante de Tilinha que agarrando esta pelo braço,
convidou-a a retirar-se.
Alexandre, tomando por uma afronta, travou-se de razões com
o seu rival e, puxando de uma faca, desferiu uma certeira punhalada em João
Alves, ferindo-o no vazio, no lado direito e deixando-o prostrado ao solo.
Ato contíguo o criminoso tentou fugir, sendo, porém, em
seguida preso e recolhido ao posto policial, à ordem do Sr. Delegado de
polícia.
Transportado o ferido para a Santa Casa, foi ali atendido
convenientemente pelos Srs. Drs. Ariano de Carvalho e Victor Russomano, ficando
em tratamento na Enfermaria Pimenta.
O seu estado, até a hora desta notícia, era melindroso.
O guarda nº8, do 2º
posto, quis virar a bicho
O guarda nº8, do 2º posto, que era todo
metido a valente foi, dia 1º de janeiro de 1917, destacado para fazer guarda a
porta do Salão Marly, à Rua 7 de Abril.
Ali, como todos sabiam, dizia o repórter de O Rebate, era um foco de desordem e
perdição, juntava gente da pior espécie, havia sempre indivíduos que só queriam
era fazer desordens.
O caso é que, às 23 horas, entrou para se divertir um grupo
de badernistas, fazendo grossa algazarra. O nº8, querendo deitar energia,
chamou os referidos desordeiros à ordem e os quis prender; porém, eles que não
estavam dispostos a serem presos, agarraram o guarda a unha e, depois de o
desarmarem, deram-lhe muitas taponas.
Aos apitos de socorro, compareceram vários guardas da
polícia que prenderam os desordeiros.
Homem vilmente
espancado e ferido
Como previra o redator de O Rebate, na sua última local sobre os bailes
do famigerado Salão Marly, deram-se no mesmo novas e repugnantes cenas de
escândalo e selvageria promovidas pelos
frequentadores da referida espelunca, e pela incorrigível polícia vernetiana,
afirmava o jornalista.
Como pano de amostra do que foram as orgias realizadas no sábado
e domingo, naquele antro de devassidão, apadrinhado pelas autoridades, o
jornalista iria relatar o revoltante fato ali ocorrido: pelas 3 horas da manhã
de hoje, 8 de janeiro de 1917, quando estava quase a findar o maxixe desenvolto,
travaram-se de razões e chegaram às vias de fato as mulheres Albertina Silva e
Alice de tal.
Fernando Marques, de profissão jornaleiro, com 20 anos de
idade, solteiro, que tomava parte na farra do Marly, interviu a fim de reparar
as contendoras.
Nesse ínterim, acudiram guardas da polícia administrativa e
entram a espancar as mulheres.
Fernando protestou contra a violência, e isso tanto bastou
para que o metessem num círculo de ferro, malhando-lhe espada a dizer basta!
Os guardas nºs 2, 4, 10 e 11, do 1º posto, e o vigilante nº
3, do 3º posto, como verdadeiras feras, isolaram a vítima num pátio contíguo ao
salão do maxixe e desancaram-no a estouros!
Foi uma cena revoltante, miserável, indigna, só admissível
entre bandidos.
O infeliz homem, atingido pelo furor e pela valentia de
cinco desordeiros fardados, ficou em miserável estado, apresentando, entre
outros, um ferimento contuso no braço esquerdo, outro na cabeça e grande número
de contusões pelo corpo.
O local onde ocorrera o fato apresentava, pelas paredes,
muitas manchas de sangue derramado pela vítima, o que também se notava da Rua 7
de Abril à Paysandu [Barão de Santa Tecla], em grande extensão.
Depois do bárbaro espancamento, os famigerados policiais
prenderam Fernando e meteram-no no xadrez do 3º posto onde se achava recolhido.
Fernando foi medicado na Santa Casa, antes de
encarcerarem-no.
Eis aí o que era a polícia de uma terra civilizada!,
exclamava o jornalista.
Eis aí os frutos da tolerância criminosa das autoridades
para com um antro imundo de perdição, que, como afronta a sociedade e aos bons
costumes, funcionava impunemente numa zona habitada por famílias!
Para quem apelar?!
ECCO IL PROBLEMA...
Continua...
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(*) Extraído do livro, ainda inédito, A
princesa do vício e do pecado
Revisão do texto: Jonas Tenfen
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