Uma das versões que se inscreve há tempos para ser a versão
oficial da origem da expressão Xavante, para denominar o torcedor do Grêmio
Esportivo Brasil, de Pelotas, é a de que um dirigente do Esporte Clube Pelotas,
no Bra-Pel de nº 102, realizado no reduto dos áureo-cerúleos aos 28 de julho de
1946, depois de um incidente provocado pela torcida dos rubro-negros, teria a
eles se referido como se fossem “uns bárbaros”. Acrescentam ainda que, por
coincidência, naquela época um dos cinemas da cidade exibia o filme intitulado Invasão dos Xavantes e que, por analogia
com os protagonistas, os torcedores do time rival passaram a chamar os
torcedores rubro-negros desta forma.
Próximo àquele clássico Bra-Pel, embora sete anos antes, sob
o título de No Reinado dos Xavantes,
também denominado de Bandeira Piratininga,
fora exibido na sala Alhambra, em São Paulo, aos 10 dias do mês de fevereiro de
1939, este documentário, sob a direção de Wili Aurelli, produção da Americam
Films, fotografia de José Carrari, sonografia de Aurélio Aurelli e montagem de
Achille Tartari; segundo nos consta, tal documentário não foi exibido em outras
salas de cinema do território nacional.
Posteriormente a produção e exibição daquele documentário, o
que houve foi uma matéria veiculada no Diário
Popular, desta cidade, em 12 de setembro de 1946, com o seguinte título:
“Impressionantes episódios do encontro com os chavantes [sic]”, onde se pode
ler que continuavam despertando curiosidade as revelações que estavam sendo
feitas pelo funcionário do Serviço de Proteção aos Índios, Sr. Francisco Soares
Furtado de Meireles, que chefiara a turma “que
teve o primeiro contato com os índios chavantes [sic]” [destaque nosso].
Considerando as datas, tanto a do documentário (10-02-1939)
quanto a da matéria veiculada na imprensa local, via Diário Popular de 12 de setembro de 1946, resta-nos pouca ou quase
probabilidade alguma de associarmos o apelido de “xavante” dado ao torcedor
rubro-negro, a partir de episódio ocorrido na tarde de 28 de julho de 1946,
tarde em que o time do Grêmio Esportivo Brasil venceu ao Esporte Clube Pelotas
pelo placar de 5 x 3.
Diante disto podemos deduzir que a origem do apelido
“xavante” não está naquele Bra-Pel, ocorrido na tarde de 28 de julho de 1946;
mas, antes de nos debruçarmos em busca da provável motivo desse, vamos repassar
alguns aspectos do ocorrido naquele encontro entre os dois times naquela tarde
de domingo, reproduzindo alguns detalhes daquele jogo, segundo palavras de um
cronista esportivo, que ao famoso Bra-Pel dos 5 x 3 assistiu:
“Inicia-se o segundo período de jogo, com os ânimos altamente
exaltados por força da atuação vacilante do árbitro.
“Aos seis minutos, os protestos da torcida atingem um grau
de excitação tal, que

se tornou franco o desentendimento entre juiz e
jogadores, tendo aquele adotado a resolução que a todos afigurou absurda, de
expulsar do campo, o capitão [Chico Fuleiro] do esquadrão de Teté [técnico do
Grêmio Esportivo Brasil].
“Justamente alarmado em face da perspectiva de passar a
atuar desfalcado de um dos seus mais valiosos elementos, o onze rubro-negro
procura inutilmente se rearticular. Finalmente, atendendo ao que parece, a
determinação de um dos seus dirigentes, e mais do que isso, ao incentivo da
torcida decepcionada pela aparente supremacia, até ali demonstrada pelo
adversário, tomaram a resolução de abandonar o gramado.
“Entrementes, o técnico Teté, prevendo em tempo, as
consequências desastrosas de semelhante deliberação reconduz seus pupilos ao
teatro da luta, exortando-os a prosseguirem nela até o fim. A assistência
prorrompe então, em aplausos calorosos a atitude sensata do técnico rubro-negro
e a partida se reinicia depois de uma interrupção de alguns minutos”.
E assim se deu a caminhada, de uma virada histórica, em uma
partida que parecia que iria terminar, com a vitória dos áureo-cerúleos, pelo
escore de 3 x 1.
Palavras do cronista
esportivo de A Opinião Publica sobre o final da partida
“Clube eminentemente popular, conta o rubro-negro com um
núcleo de torcedores verdadeiramente enorme, e foi essa massa vibrando de justo
entusiasmo que ao terminar o memorável prélio, invadiu o gramado com o objetivo sadiamente esportivo de
expressar aos seus craques a sua gratidão pelo espetáculo sem par com que
haviam brindado a assistência” [público] (destaque nosso).
E assim concluiu o
jornalista: “Carregados em triunfo pela massa de simpatizantes sequiosos de dar
expansão ao seu contentamento, o esquadrão de Tefé, recebeu naquele instante
como merecido premio a sua atuação sem precedentes, a mais empolgante
manifestação que uma torcida pode fazer aos componentes do seu quadro. Enchendo
por completo o gramado que fora teatro da peleja, os manifestantes extravasaram assim, a sua alegria tão contagiante, que
se apossou e emocionou profundamente a todos quanto a presenciaram, mesmo
aqueles que nutriam simpatia pelo outro bando, tal era a sinceridade e a
patente espontaneidade da sua exteriorização [destaque nosso].
“Fundamente sincera, essa manifestação assumiu aspectos de
autêntica apoteose”.
E agora nos cabe perguntar: foram estes os bárbaros? O
espetáculo descrito pelo cronista esportivo revela em algum momento atitudes ou
comportamento de bárbaros? Não. Se algo de revelador há nessa versão, que não
se sustenta é, acima de tudo, o preconceito contra a cultura de um povo
indígena...
A provável origem do
glorioso apelido
Meu interesse em buscar a origem desse apelido, xavante,
nasceu de um conversa com dois amigos, também rubro-negros, na qual prometi a
eles averiguar se as versões que eles conheciam se aproximavam ou tinham algo
realmente comprovável.
A partir de então, resolvi verificar nas notícias, quase
diárias na imprensa de Pelotas, se encontrava algo verossímil. Percorrendo
jornais existentes na hemeroteca de nossa Bibliotheca Pública, vasculhei duas
décadas dos jornais existentes no período de meados dos anos 40 até o final dos
anos 50.
Continua...
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Fontes de pesquisa: Bibliotheca Pública
Pelotense-CDOV e acervo particular de
Douglas Almeida
Revisão do texto e
tratamento de imagem: Jonas Tenfen
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