A.F.Monquelat
A partir da intimação
feita pelo Sr. tenente-coronel delegado de polícia aos bodegueiros da Rua
General Osório, bem como aos donos de bodega no porto da cidade, em fevereiro
de 1891, locais onde havia maior concentração dessas casas de negócio, para que
dispensassem as dulcineias, frequentadoras
e moradoras de seus estabelecimentos, com o pretexto de serem estas as grandes
responsáveis pelas desordens ocorridas, houve, de forma gradativa, uma diáspora
e, consequentemente, migração de prostitutas para outros pontos da cidade.
Acreditamos que tal ato migratório tenha acontecido da
seguinte maneira: as meretrizes frequentadoras e moradoras das bodegas da Rua
General Osório, que, por longo tempo foi o primeiro e principal point de suas
atividades, até porque seus clientes eram, na grande maioria, tropeiros,
colonos e outros, assíduos frequentadores das bodegas ali existentes, quase
sempre localizadas no período que abrangia da Rua Voluntários até a hoje
Avenida Bento Gonçalves, situação essa que durou, pelo menos, até a
desobstrução da foz do canal São Gonçalo.
Com a desobstrução do Canal, tornou-se o porto da cidade um
local bastante promissor para os bodegueiros e meretrizes que, embora
inicialmente em menor proporção, ali vieram a exercer suas atividades.
Quando da intimação, tanto uns, umas e outros, tiveram de
readequarem-se as novas regras determinadas pelas autoridades, em nome do
sossego, bem estar e da moral dos cidadãos da pérola, que se transformara em
princesa. Porém, como nem só de trabalho vivem os vassalos, novos locais foram
alvo daqueles que queriam gozar de outras formas de vida, até porque não tinham
sido aquinhoados ou tampouco encontraram condições de se aquinhoarem nessa
minicorte, que era Pelotas.
Pelotas, nesse período, guardada as proporções, tornara-se
uma cidade cosmopolita e, entre a diversidade de seus habitantes, em sua
maioria ex-escravos e pobres, somavam-se os inúmeros imigrantes não colonos,
que eram os artesãos e aventureiros, atraídos pelo luxo e esplendor que as
guaicas dos “pataqueiros da aristocracia do sebo” construíram.
Voltando aos nossos
bodegueiros e dulcineias do passado,
que já não eram mais vassalos do Império, e sim, servos da República,
espraiaram-se estes então pela zona da Várzea, e outros em direção ao Mercado
Público, sem esquecermos-nos das prostitutas que já estavam, ou vieram a se
localizarem nas ruas Voluntários, 16 de julho [Dr. Cassiano] e 3 de Fevereiro
[Major Cícero].
E
é nesta transição e cenário que vemos surgir bem próximo ao quadrilátero do
poder político e econômico as primeiras bodegas da Rua Tiradentes, uma delas de
propriedade da italiana de nome Catharina Cuniga; bodega que, em curto espaço
de tempo, se tornaria célebre e
contribuiria para que esta rua se tornasse, por longas décadas, o assunto
preferido das páginas de ocorrências policiais.
Assim
é que Vitú, jornalista da Opinião Pública,
em sua coluna do dia 3 de fevereiro de 1898, comentando sobre a ordem que
reinava, à noite, em Pelotas, dizia estarem os moradores da Rua Tiradentes
iniciando um abaixo-assinado contra os escândalos que aconteciam na bodega de
uma italiana.
Além
das musicatas [músicas de baixa qualidade artística] e imoralidades, as
bebedeiras ali eram frequentes, com grave escândalo da moral pública.
Quem
cuidaria daquilo? Perguntava o colunista.
Cachorro de Catharina leva Papagaio à cadeia
Dia 31 de janeiro de 1900, a bodegueira
Catharina Cuniga que tivera um palpite para o jogo do bicho, palpitara que
daria cachorro, bichinho este de sua predileção, pela sua tradicional lealdade
e de amigo certo, e lá foi ter com o bicheiro Manoel Gomes dos Santos, vulgo Papagaio.
Catharina estava certa,
deu cachorro.
Acontece que Papagaio
recusou-se a pagar o premio do jogo que com ele havia feito Catharina.
Não deu outra, lá foi a bodegueira para a delegacia
queixar-se ao Sr. delegado de polícia, da cachorrada do Papagaio.
A polícia, porém, que não estava aí para apurar esses incidentes da afeição, deu com o Papagaio e a devota do cachorro no
xadrez, o primeiro por vendedor falso
de cachorros e a segunda por acreditar demais na sorte destes.
Por causa de um troco
Ferimento
grave: ontem, 23 de junho de 1901, às 23 horas, entraram na bodega de Catharina
Cuniga, à Rua Tiradentes, entre 15 de Novembro e General Vitorino [atual
Anchieta], dois orientais que pediram um copo de caninha.
Pouco
depois, esses orientais, por causa de um troco, promoveram desordem na referida
bodega, alarmando a vizinhança.
O
Sr. Álvaro Alberto, português, morador no prédio 81, fronteiro a casa onde se
dava a rixa e ali estabelecido com sapataria, saindo para ver o que ocorria,
foi inesperadamente agredido por um dos orientais, que, armado de faca, lhe
desferiu profundo golpe, abaixo da mamica esquerda.
O
criminoso foi logo preso e remetido para a cadeia civil, bem como o seu
companheiro de falcatruas.
Ambos
se negaram a dar os nomes.
Álvaro
Alberto foi levado à Farmácia Providência, onde foi medicado pelo Dr. Alves
Requião.
O
seu estado era grave, achando-se ele em sua residência, no referido prédio.
O
ferido era um homem trabalhador e gozava de bom conceito entre seus vizinhos.
Aberto
o inquérito pelo Sr. delegado de polícia sobre o ferimento grave, recebido pelo Sr. Álvaro Alberto, o ofensor,
que se encontrava preso, disse chamar-se Mariano Mancia e que fora, por muito
tempo, ordenança do finado major da brigada militar Utaliz Lupi.
O
Sr. Álvaro, dois dias depois da agressão, apresentava sinais de melhoras.
O golpe do Vigário
Aos 28 de agosto de
1911, era comunicada a prisão de vários gatunos, os quais haviam sido
fotografados por Rafael Grecco, no 3º posto, onde estavam recolhidos aguardando
a ação da justiça.
Dentre os gatunos presos, estava o menor João Pires Toledo
que, segundo o jornal Opinião Pública,
era o autor do conto do vigário de que fora vítima Catharina Cuniga.
Desordem na bodega
Dia 13 de outubro de
1911, às 20h30, na conhecida bodega de Catharina Cuniga, foco de contínuas
desordens, dois soldados do Exército promoveram grossa baderna, provocando
grande ajuntamento de povo.
Ao trilar de apitos, compareceram vários guardas da Polícia
Administrativa, que a muito custo conseguiram levar os perturbadores da ordem
ao lº posto.
O fato foi comunicado, pelo telefone, ao tenente Manoel de
Faria Corrêa, comandante do destacamento do Exército, o qual deu as devidas
providências.
Encontrado morto
Dia 14 de junho de
1913, às 13 horas, uma empregada da bodega de Catharina Cuniga encontrou morto,
à Rua Tiradentes nº 564, um homem de cor branca, de 70 anos presumíveis.
Em seu quarto, foram encontrados uma mala de mão e um baú
contendo roupa.
Comunicado o fato ao Sr. capitão Pedro Dias, delegado de
polícia, este compareceu em companhia do Dr. Arnaldo Menezes, médico municipal
e que atestou o óbito.
Aquela autoridade providenciou no sentido de ser o cadáver
removido para o necrotério da Santa Casa.
Agressão na espelunca da Catarina
Dia 3 de janeiro de 1914, à noite, na espelunca de Catarina
Cuniga, Sílvio Veleda, depois de rasgar as vestes de sua amásia a espancou
brutalmente.
O agressor foi preso e recolhido ao 1º posto.
Prostitutas promovem desordem na bodega
À celebérrima quadra da Rua Tiradentes,
entre 15 de Novembro e General Vitorino, na famosa bodega de Catharina Cuniga,
a mulher Colota, vulgo Ruiva,
promoveu dia 16 de janeiro de 1915, grande desordem com suas companheiras de
prostituto.
Comparecendo um guarda do 1º posto, a desalmada fugou,
barafustando pelo Hotel Portugal.
O guarda, cujo número de identificação desaparecera muito de
propósito, invadiu o estabelecimento e, sem pedir licença a quem quer que
fosse, arrancou dali a mulher, a socos e pontapés, e do mesmo modo conduzindo-a
até o 1º posto.
Como se vê, a nossa polícia prima sempre pela cortesia e
urbanidade, conhecendo a fundo as leis e as regras de educação!...
Baderna na espelunca da Catarina
Augusto José Farias, 30 anos de idade, “cor preta”, natural
de Canguçu, residente nas Três Vendas, meteu-se em uma baderna, dia 22 de março
de 1915, na Rua Tiradentes em casa da celebérrima Catarina Cuniga, tendo
recebido um ferimento inciso da região frontal esquerda, produzido por copo que
lhe foi arremessado.
A polícia não tomou conhecimento do fato.
Nova desordem na bodega da Catharina
Aos 17 dias de abril de
1916, à noite, vários indivíduos promoveram grande baderna na bodega de
Catharina Cuniga, na Encrencópolis,
havendo garrafas e móveis quebrados.
Ao se aproximar a polícia, os badernistas fugiram.
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(*) Extraído do livro, ainda inédito, A princesa
do vício e do pecado
Estamo no aguardo da obra citada! Moizes.
ResponderExcluirMestre Moizes, o livro está revisado, formatado e com sugestões de capa, somente aguardando o OK do editor para ser impresso, ou não... Vamos aguardar. Grande abraço.
ResponderExcluirTambém estou no aguardo do livro.
ResponderExcluirÓtima noticia, livro novo em breve. Libera ai editor. Abraço. Fábio
ResponderExcluirOi!! Estou pesquisando sobre a prostituição e possiveis prostíbulos na antiga Pelotas e gostaria de saber se podes me sugerir fontes, sobre o assunto? Obrigada.
ResponderExcluirBom dia, Estela. O que são possíveis prostíbulos na antiga Pelotas? Qual o recorte da tua pesquisa? Tenho um trabalho, ainda inédito, que titulei de "A princesa do vício e do pecado", cujo 1º volume vai de 1875 a 1920, que dada a demora do editor em publicá-lo, publiquei em artigos no DM e aqui no blog, que talvez possa te auxiliar. A prostituição, grosso modo, em Pelotas não foi praticada em casas com essa finalidade, e sim nas bodegas ou tascas ou tavernas e, a partir daí foi acontecendo... como verás nos artigos, já publicados, alguns com o título de "Pecado", outros como o da Catarina Cuniga e outros como O Cabaré da Lili, já em quarta parte aqui no Blog. Para maiores detalhes ou outras informações: afmonquelat@gmail.com
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