Quando a até
então denominada “Pérola do Sul” se transformou em “Princesa do Sul”, por volta
dos anos de 1860, agregou a essa metamorfose alguns elementos, se não desconhecidos,
pelo menos não institucionalizados, dentre eles o jogo, a prostituição e a
feitiçaria.
O progresso e a
modernização de Pelotas, uma cidade materialista, se fez acompanhar de um
aparato de repressão, que se fazia presente em toda e qualquer manifestação
popular. Trabalho sim, diversão não.
Essa repressão,
consequência de uma sociedade escravocrata onde poucos tinham muito, e muitos
tinham apenas o trabalho forçado, no entanto, não conseguiu evitar que os
excluídos da história encontrassem meios de manifestarem outras vontades,
desejos e práticas, que não apenas as voltadas para o trabalho e a submissão às
regras de uma sociedade, cujo único propósito era explorá-los.
E, como primeiro
exemplo de nossa afirmação, trazemos o caso ocorrido na noite de 16 de março de
1875 quando a polícia invade de surpresa uma casa localizada na Rua General
Osório, esquina da Rua Santo Antônio [atual Senador Mendonça], casa esta que,
segundo o Jornal do Comércio, possuía “o avultado valor de
40$000 réis aproximadamente, em gêneros e armação”.
A inesperada
visita da polícia, que não fora convidada, foi motivo suficiente para que o
divertimento terminasse, pois a música dispersara-se e as damas assustaram-se.
Dentre os
convivas, no total de 15 cavalheiros, diz a notícia, se encontravam alguns
moços ali levados pela sua inexperiência, mas de conduta regular, e outros de
ocupação e meio de vida duvidosos.
Todos foram
recolhidos ao xadrez do quartel da polícia, onde passaram a noite, e noite bem
cruel, pois as gargalhadas da “orgia, foram substituídas pela tristeza da
prisão”.
Aquela invasão
foi efetuada pelos “ativos” Srs. delegado e subdelegado de polícia, major
Francisco Nunes de Souza e capitão Manoel Luiz da Cunha, devidamente
acompanhados.
No dia seguinte,
16 de março, sendo todos os reclusos chamados, 12 foram postos em liberdade,
visto terem exibido provas de sua boa conduta e acharem-se empregados, e 3,
“considerados como vagabundos”, seguiram naquele mesmo dia para a cidade de Rio
Grande, “como recrutas para o exército ou para a armada”.
Segundo o
redator da notícia, a investida das “dignas” autoridades obtivera um feliz
resultado; pois , aqueles três homens ainda poderiam vir a ser úteis “a si e a
pátria”.
Continuasse,
portanto a polícia a fazer suas visitas por aquelas espeluncas situadas em
diversos pontos da cidade, onde se juntavam os “vagabundos”, que, por certo, o
número de “ratoneiros [gatunos, larápios]” diminuiria consideravelmente, e o
“nosso exército e armada” disporiam de mais soldados.
Por causa de uma meretriz
Em consequência
de duas punhaladas que no dia anterior lhe desferira seu compatriota José
Ferreira Lourenço, falecia, dia 5 de setembro de 1875, na Santa Casa de
Misericórdia, o súdito português Joaquim Mendes Ribeiro.
A meretriz
Madalena fora a causa principal de tal acontecimento: em casa desta
encontravam-se os dois que, depois das agressões verbais, chegaram às vias de
fato.
Revira e orgia na casa do Nogueira
Estava lá, ora,
pois, o português José de Pinho Nogueira, casado, a dar um maxixe familiar ou uma revira
em sua casa, na Rua Conde d’Eu [atual Avenida Bento Gonçalves], tendo como
convidados alguns negros e negras cativos, e três negras e um pardo livres,
quando os policiais da polícia fixa e da particular, sob o comando do Sr.
Souto, entraram e acabaram com a festa.
Para o
jornalista do Diário de Pelotas, a
família do Nogueira não podia ser considerada decente, pois, do contrário não
consentiria em casa uma “revira [dança de negros] composta de escravos”. Além
do que, no próprio quarto do “Sr. Nogueira, junto com a esposa dele, foram
encontradas 3 negras e um pardo livres!”.
Tendo o Correio Mercantil contestado certas
declarações do Diário de Pelotas,
quanto a alguns detalhes do ocorrido, revidou este dizendo que, além do
Nogueira, três escravos do Manoel J. de Oliveira e um do Antônio Leite terem
sido levados presos, a polícia “só se apoderou de duas gaitas e um violão”, que
se achavam à disposição no quartel para serem entregues aos seus donos; agora,
quanto a bebidas, doces, café e etc., a polícia nada daquilo vira, no tal revira ou maxixe familiar.
Encerrando a
polêmica, o Diário de Pelotas dava
por finda “esta questão. Não pode classificar como chefe de família quem
consente, em sua casa, com sua esposa, uma bacanal de negros cativos”.
Embora não
tenhamos elementos necessários para avaliar o que realmente aconteceu na casa
do Nogueira, além dos ditos pela imprensa, a única cena que pode nos levar a
pensar que o tal maxixe familiar virara uma bacanal, é a passagem em que a
esposa deste fora encontrada no quarto do casal com “3 negras e um pardo
livres”, portanto não era, caso fosse, uma “bacanal de negros cativos”.
Fica-nos parecendo, isto sim, é que a censura por parte do Diário foi quanto ao Nogueira ter dado um maxixe familiar com a
presença de negros e negras, livres e cativos.
Sapateiro esfaqueia a Periquita
Às 19 horas do
dia 3 de julho de 1876, foi ferida, com duas ou três facadas, uma “dessas
infelizes vítimas da prostituição”, de nome Maria Faustina dos Santos, vulgo Periquita.
Foi autor deste
crime o português José Maria de Siqueira, homem de 28 anos, sapateiro de
profissão, dado, segundo diziam, a maus costumes e ao vício da embriaguês.
Maria Faustina,
a Periquita, morava em um quarto do
botequim do Sr. Porfírio José da Costa Brasil, localizado à Rua General Osório.
José Maria, com
quem Maria Faustina tinha relações, ali entrou e, por motivos fúteis, começaram
a discutir. Das palavras passaram às ofensas físicas, resultando destas um
primeiro ferimento na Periquita. Esta
saiu para fora do quarto, dizendo que ia queixar-se à autoridade e, quando já
estava na rua, passados poucos momentos, foi novamente agredida por José Maria
que lhe desferiu mais algumas facadas, das quais uma próxima ao pulmão direito.
Encontrando-se
na ocasião um policial da seção fixa, e tendo-se aglomerado muita gente, José
Maria foi preso em fla grante delito e conduzido ao xadrez da polícia, onde
pernoitou, passando no dia seguinte para a cadeia civil.
A agredida ainda
teve forças para ir queixar-se ao subdelegado de polícia, que a mandou ao Dr.
Maia, de quem recebeu os cuidados e curativos necessários.
Dia 4 de julho,
na subdelegacia, fizeram o inquérito do réu e testemunhas.
José Maria negou
o fato e alegou que estava embriagado; porém, ao mesmo tempo em que declarou de
nada se lembrar, confessou que trazia uma faca “de tal e qual qualidade” que
deixara no quarto da agredida.
As testemunhas
foram unânimes em atribuir-lhe o delito.
Não era a
primeira vez que José Maria maltratava a infeliz Maria Faustina. Há não muito
fora preso por idêntico fato, mas de menor gravidade.
O médico que
examinou a vítima não havia respondido aos quesitos que lhe foram apresentados,
segundo entendimento do jornalista, deveria qualificar os ferimentos como
leves.
Continua...
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*Extraído do livro, ainda inédito, A princesa do vício e do pecado
pois a ampulheta do tempo leva consigo estes fatos , outros e a história...a não ser pelos benévolos escribas, que se esforçam em registrá-los ,para nosso gaúdio...... ficariam perdidos na poeira do passado..!
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