Dentre os becos, corredores e cortiços
que a miséria e a especulação imobiliária se encarregaram de criar em Pelotas,
estava o célebre Corredor do Pacheco
localizado à Praça da Constituição nº9.
Naquele local, a tragédia vivia à
espreita e à espera de um quase nada para acontecer, e, assim, quando tal
acontecesse se apoderar de um, ou até de maior número de moradores.
Dentre os inquilinos do Corredor estava o “preto” Arnaldo de
Oliveira Neto, foguista da fábrica de chifres da firma Bertoni & Cia.
Ltda., com sua mulher Sebastiana de Oliveira Paz, de 25 anos, e três filhos
menores.
Ao lado, em um quarto, morava o
sapateiro Santos Pagno, italiano, casado, com 42 anos, e sua amásia Beatriz de
Carvalho.
Entre esses vizinhos nada de anormal se
passava. No dia 8 de fevereiro de 1926, contudo, ao meio-dia, Santos, cujas
grosserias eram conhecidas de todos os moradores do Corredor, pegou no braço de Arnaldo, dizendo que tinha um assunto
para tratar com ele, em sua própria casa.
Uma vez ali, no interior do pequeno
quarto de Arnaldo Santos, sem demonstrar seus instintos sanguinários, sacando
de uma faca nova, investiu contra Sebastiana, desferindo-lhe quatro golpes que
a atingiram em ambos os braços, na cabeça e nas costas, todos de caráter leve.
Em seguida, e de forma violenta, Santos
vibra uma única punhalada no pai de Sebastiana, Antônio Ângelo Corrêa Paz, de
92 anos, branco, que estava almoçando.
O nonagenário recebeu certeira
punhalada na clavícula esquerda, atingindo o coração e provocando-lhe a morte
instantânea.
Arnaldo, vendo-se na eminência de ser morto,
trava com Santos renhida luta, recebendo três ferimentos no pulso direito,
vazio e costas, conseguindo, mesmo assim, subjugar o feroz adversário.
Em seguida, Arnaldo, tomando a faca de
Santos, vibrou-lhe dois golpes no abdômen, lado direito, que lhe ocasionaram a
morte.
Nesse ínterim, acudiram alguns vizinhos
e transeuntes que avisaram a polícia.
No Pacheco compareceram os Srs. tenente Camilo
Gomes, delegado de polícia, capitão Arnoldo Siqueira, subintendente, comissário
Abelardo Miranda, do 1º posto, que providenciaram para remover os feridos e os
mortos.
Estes deram entrada no Necrotério e os
outros na Santa Casa, onde foram atendidos pelos Drs. Victor Russomano, Ariano
de Carvalho e José de Mendonça .
Antônio Ângelo, o nonagenário, era
muito conhecido, pois há anos esmolava pelas ruas da cidade.
Era de pequena estatura e andava sempre com duas muletas,
sendo muito estimado no comércio, pelo seu gênio alegre.
Às 16 horas, daquele mesmo dia, no
Necrotério, foi realizada a autópsia nas vítimas pelo Dr. José de Mendonça, interno
da Santa Casa.
Na delegacia de polícia, era feito o
interrogatório das testemunhas arroladas.
No dia seguinte a tragédia, a população
continuava impressionada com o acontecimento.
E a imprensa, procurando melhor
informá-la, acrescentava ao já divulgado os antecedentes do crime, dizendo que,
dias antes do fato, um dos filhos de Arnaldo, de 6 anos de idade, apenas por
meros brinquedos de criança, provocara por parte do assassino fortes
repreensões.
A mãe, como era de se esperar, saiu em
defesa da criança:
- Não tenho medo de caras feias –
exclamou Sebastiana – aos ouvir as ameaças de Santo.
Este nada respondeu, retirando-se para
o seu quarto, ruminando, durante dias, a ideia sangrenta de se vingar de uma
arte de criança.
É provável que ninguém, sequer, pudesse imaginar que o
italiano Pagno desenvolvesse tamanho ódio por episódio tão banal, a ponto de se
tornar o principal personagem da tragédia do Corredor do Pacheco.
Durante toda a tarde, era grande o número de curiosos, em
torno do prédio do Necrotério.
Arnaldo Oliveira Neto, que era um robusto crioulo, de 30
anos, estava recolhido à enfermaria Pimenta, no leito de nº36.
Apresentava Arnaldo, o foguista, um ferimento mais
penetrante no tórax lado esquerdo, outro no braço do mesmo lado e um terceiro
na cabeça. Entretanto, o estado do ferido não era grave.
Sebastiana Corrêa Paz, de 25 anos, estava recolhida à
enfermaria Dr. Veloso.
Ela apresentava dois
ferimentos na cabeça, sendo um até o osso do crânio, um ferimento, leve, no
pulso direito, outro mais profundo no dorso da mão esquerda, que atingira os
tendões, e outro ainda nas costas, o que tornava evidente o golpe traiçoeiro.
Como se não fosse suficiente aquela desgraça, à noitinha
, o menor Antônio, de 6
anos, que já estava doente quando da ocorrência e que, sem o pretender, fora o
pivô de toda aquela tragédia, que veio a abalar a cidade, veio a falecer.
O assassino, que morrera, era como já o dissemos de
profissão sapateiro e tinha maus precedentes.
Há tempos procurara ele trabalho na fábrica de sapatos
Russomano, tendo, na ocasião, dito que havia saído de Caçapava por ter matado
alguém naquela cidade, e ser desde então procurado pela polícia.
Quando caiu ferido, o sapateiro Santos Pagno ainda pediu um
cigarro, que não chegou a fumá-lo por inteiro.
Esvaindo-se em sangue, e sentindo a morte próxima antes de
morrer falou:
- Levem-me para o hospital, eu tenho dinheiro para me
tratar.
Mas, de nada valeu o dinheiro dele, pois os golpes que
recebera foram mortais.
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Fonte de pesquisa:
Bibliotheca Pública de Pelotas/CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen
Postagem: Bruna Detoni
Imagem: Acervo A.F.
Monquelat
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