Justamente com o material apreendido, estava em poder das
autoridades uma “capciosa” lista de endereços e números de telefones,
pertencentes, por certo, a clientes do “milagroso” Osório.
Todas as pessoas relacionadas na lista estavam sujeitas a
serem convidadas pela polícia a prestar declarações, que, aliás, a imprensa não
tinha dúvidas, de que isso acontecesse.
Batuque?
Dois objetos foram encontrados no “arsenal” de Osório que,
perfeitamente, davam para desconfiar que ali, também, se realizavam as célebres
sessões de batuque. Queriam se referir a um enorme cacete de pau descascado e a
dois grandes chocalhos, inteiramente de bronze. Indagado Osório sobre os
objetos suspeitos, declarou, como sempre, que faziam parte do culto.
O alívio do Osório
Em conversa com a reportagem do Diário Popular, disse Osório que estava há muito tempo arrependido
de se ter envolvido com semelhante profissão. Sentia-se “agora” muito feliz,
pois não podia abandoná-la, conquanto, pelo juramento prestado, de fidelidade,
ao ritmo africano, só poderia rompê-lo obrigado pela intervenção de terceiros.
O elogio à ação das
autoridades
Muito havia feito naqueles últimos tempos, em benefício da
coletividade, “as nossas autoridades” policiais e, haviam dirigido pessoalmente
os trabalhos, os Srs. capitães Cezar Brizolara e João Gomes Nogueira, delegado
e subdelegado de polícia, respectivamente.
Osório, em liberdade
Findas às 24 horas de detenção, prevista pela lei para o
caso, foi posto em liberdade, dia 22 de abril, ao anoitecer, “o charlatão”
Osório.
Em suas declarações na delegacia de polícia, Osório disse
que não mais se envolveria em semelhantes “negócios”.
O mandingueiro seria processado, tendo já contratado para
sua defesa os serviços do advogado Dr. Juliné da Costa Siqueira.
A morte de Osório
Dia 15 de março de 1938, sob o título “De luto a macumba em
Pelotas”, era dito que correra rápida a notícia, às primeiras horas da noite
anterior, da morte do conhecido macumbeiro Osório Francisco Vieira.
Fazia poucos dias que Osório enfermara e se recolhera ao
hospital da Santa Casa, é o que informava o jornal.
Desde, segundo a mesma matéria, aquela “maldita canoa
policial”, do tempo do capitão Brisolara que Osório, despojado do
“instrumental” de sua rendosa profissão, caíra no esquecimento e da saudade dos
seus inumeráveis clientes: homens e mulheres, casados, viúvos, solteiros,
desquitados, prometidos, desenganados, contrariados e tantos outros...
Pedras de cevar, dente de javali, pé de cabra, amuletos,
gonzos, colares, chifres, batuques, guizos, bengalas, pratos com legendas,
frutas de cera virgem, defumadores, piras e outras esquisitices fizeram tantas
cabeças dar voltas e “forrarem” o ponche do “gozado feiticeiro”.
Encerrava-se assim, o capítulo dessa vida misteriosa e
confidente de muita gente boa desta terra, sempre incauta e generosa.
Morreu o Osório, macumbeiro!
Sobre feiticeiros e
feitiçarias em Pelotas
Dissemos no início de nossa série sobre este assunto, feitiçaria em Pelotas, que, por se
tratar de assunto bastante delicado e complexo, não teceríamos comentários
sobre os fatos que viemos por divulgar, até porque não nos julgamos aptos para
fazê-lo. Entretanto, dada à forma como a imprensa de Pelotas o tratou, de forma
parcial, manipuladora e preconceituosa, vimo-nos na obrigação de, contrariando
nossa pretensão, de fazê-lo, ainda que de forma sucinta. Aqui, na medida do
possível, pretendemos apontar alguns senões, por demais evidentes, que o leitor
os deve ter percebido, portanto:
Quando o jornal O Dia,
em 11 de setembro de 1916, anunciava como reportagem sensacional, “Uma
digressão ao mundo dos exploradores”, com a intenção de mostrar aos seus
leitores como se vivia em Pelotas à custa da ingenuidade religiosa dos incautos,
é evidente que não achávamos que o fosse fazer de maneira imparcial, pois, pelo
menos duas palavras da afirmação do jornal serviam como sinal de alerta: exploradores e incautos.
Considerando que a palavra exploradores antecede ao que viria a ser revelado, ela então pode
ser interpretada como um pré-julgamento àqueles que professavam algum tipo de
atividade religiosa, do contrário a série jornalística traria uma série de
entrevistas com estes, o que não ocorreu, assim como não se preocupou a
reportagem em ouvir as pessoas que procuravam aqueles locais, que a imprensa
jocosamente tratou por templos ou até
mesmo por antros, acrescido ainda de
um total desrespeito com os objetos e imagens ali encontrados.
Já a palavra incautos,
tanto pode ser entendida como imprudentes bem como por crédulos, mas no caso em
questão acreditamos que a mesma tenha sido empregada no sentido de imprudentes, descuidados e, assim sendo,
servia para classificar a todos os que procuravam os templos de culto afro, como pessoas que se deixavam enganar, por
ingênuas, e não religiosas ou adeptas de entidades e cultos de matriz africana.
A parcialidade da reportagem vai se revelando pouco a pouco
até que atinge a visibilidade quando da visita ao mandingueiro Osório, “um
homem branco, novo, robusto e de grande estatura”. “O Osório não era, como
alguns de seus colegas, natural da África”, ora, a exceção de um dos
feiticeiros visitados, nenhum outro era natural da África, o que fica
subentendido que a diferença estava no Osório ser branco e, “que o Osório não
era exagerado nos seus preços; mas que ele, acreditando piamente que a
beberagem do Osório fosse apenas uma infusão inocente, resolvera não voltar
para não perder mais tempo com o mandingueiro”. Já a beberagem dos outros visitados pelo jornalista, foi enviada
para análise.
Com o decorrer dos anos, a pressão naqueles que professavam
a religião ou cultos de origem africana, não esmoreceu, tanto que em 1937, por
exemplo, quando da blitz efetuada na casa da baiana Ecilda, e que resultou na
apreensão de farto material, vulgarmente
empregado na prática de feitiçarias, como castiçais, milho torrado, conchinhas,
pedras do mar, búzios, azeite de dendê, colares de contas, baralhos da sorte e
paninhos, com os quais fazia as amarrações, etc., etc., ora, castiçais,
milho torrado, azeite de dendê e até mesmo baralho da sorte, em casa de uma
baiana como prova de feitiçaria, somente a discriminação e o preconceito podem
explicar.
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Fonte de pesquisa:
Bibliotheca Pública de Pelotas/CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen
Postagem: Bruna Detoni
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