A.F.
Monquelat
Não é fora de propósito afirmar que as raízes da violência
na cidade de Pelotas têm sua origem nas charqueadas, ou, por extensão, no ciclo
econômico que o charque iniciou, e que acarretou na continuidade dessa
violência.
Os sequelados da violência praticada, tanto no recinto das
charqueadas quanto fora delas, em Pelotas, por causa do longo período de
existência dessas, representaram um número bastante expressivo, tanto no mundo rural
quanto no urbano.
Acreditamos que essa onda de violências e barbárie, que
ainda hoje se reflete em Pelotas, seja consequência do choque de diversas
culturas e grupos étnicos que aqui se estabeleceram no passado, afora homens do
mar, tanto estrangeiros quanto de nacionalidades luso, luso-brasileira ou
apenas brasileira que por aqui aportaram.
Há em toda a linha do tempo da imprensa da cidade, ou mesmo
antes do advento desta no ano de 1851, bastando para demonstrar isso uma
leitura nos jornais anteriores a esta data, em especial os da cidade de Rio
Grande, as mais diversas violências, castigos, crimes de toda espécie em
especial contra escravos, crianças, mulheres, habitantes ou não de Pelotas.
Em certo período, como se já não bastassem os diversos tipos
de armas existentes e usadas no cotidiano da cidade, acrescentaram a essas os
imigrantes portugueses pobres, a navalha. Arma esta bastante usada tanto por
homens quanto mulheres, em especial na zona urbana, destacando-se o baixo
mundo.
No entanto, sem dúvida alguma, é no ambiente e território
das charqueadas pelotenses onde vamos encontrar a maior incidência de casos,
por isso, não nos surpreendeu quando:
Em meados de agosto de 1908, na charqueada dos Srs. Tavares
& Moreira, à margem do canal São Gonçalo, foi bárbara e cruelmente
assassinada, a facadas, a mulher Quintina de tal, branca, de 22 anos de idade,
natural deste estado, e que trajava no momento do crime um vestido de chita.
O assassino chamava-se Antônio Jorge, conhecido por Antônio
Larroti, indiático, empregado daquela charqueada.
Num casebre do estabelecimento viviam eles, há cerca de três
anos, amasiados e em perfeita harmonia.
Também morava em companhia do casal o pequeno Orestes, de 7
anos, filho de Antônio Jorge, de anterior relação.
Dois dias antes do crime, pela madrugada, Antônio saiu nu,
pela estrada em direção à cidade, onde foi logo preso e levado para o xadrez do
1º posto, após ter quebrado os vidros das janelas de varais casas.
Posto em liberdade, a pedido dos seus patrões, voltou para
sua casa, e ali declarou nada saber sobre o que havia ocorrido.
Agarrando uma grande faca, retirou-se Jorge para a rua,
dizendo que ia afiar aquela arma, a fim de terminar com a vida de sua
companheira Quintina, promessa que minutos depois cumpriu.
Amedrontada e espavorida, a malograda Quintina fugiu,
pedindo socorro, mas em vão...
O seu algoz conseguiu agarrá-la e dar-lhe mais de trinta
facadas, matando-a imediatamente.
O rosto da vítima ficou todo retalhado.
Em vista do ocorrido, o pequeno Orestes foi até a charqueada
e deu parte do ocorrido.
Ao local da tragédia compareceram o Sr. João da Silva
Tavares, que, armando vários empregados, conseguiu prender o assassino, que
procurava ferir àquelas pessoas.
O criminoso estava muito agitado e parecendo estar sofrendo
das faculdades mentais.
Tendo sido comunicada, a polícia deu providências,
conduzindo Antônio Jorge, em carro correcional, para o xadrez do 3º posto.
Depois, foi o cadáver de Quintina transportado para o
necrotério.
No 3º posto policial, onde estava preso, o assassino não
dizia coisa com coisa...
O tenente-coronel Cristóvão dos Santos, delegado judiciário,
procedeu às diligências necessárias.
Antônio Jorge, que se dizia viúvo, raptar há três anos a
desgraçada Quintina, com quem vivia amasiado e prometera casar-se.
Pelo Dr. Arnaldo Menezes, médico municipal, foi feito o auto
de corpo de delito, constatando mais de quinze ferimentos na cabeça; a mão
direita ficou quase decepada; na nuca havia dois profundos ferimentos; as
orelhas e o nariz ficaram retalhados; nas costas e tórax, outras facadas.
O assassino foi logo metido em camisa de força.
Apresentava Jorge um ferimento na testa, feito quando fora
preso e subjugado pelos empregados dos Srs. Tavares & Moreira.
No dia seguinte ao da tragédia, o criminoso, já sem camisa
de força, mantinha-se calmo no xadrez do 3º posto.
Durante as investigações, soube a imprensa que a vítima era
parenta de Nicola Vitola, morador entre os passos de Santa Isabel e Criminoso,
no município de São Lourenço.
Foi ouvido, pela autoridade policial, o menor Orestes, filho
de Antônio, que continuava em observação.
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Fonte de pesquisa:
Bibliotheca Pública de Pelotas/CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen
Postagem: Raquel
Balbinoti
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