Diante de um fato ocorrido em janeiro de 1902, na Rua
Tiradentes nº 187, no lugar conhecido pela popular alcunha de Beco do Periquito, localizado entre as ruas Marechal Deodoro e Paysandu
[atual Barrão de Santa Tecla] e que se tornou célebre nos anais da cidade
também pela alcunha de Corredor do
Periquito, aventava o jornalista do jornal Correio Mercantil a hipótese da existência em Pelotas “do original
ou de um novo Jack, o estripador”.
Por volta das 23 horas, foi o Dr. Gustavo Doss, clínico
alemão aqui domiciliado, procurado em sua residência por duas pessoas negras,
um homem e uma mulher, que, de carro, foram solicitar seus serviços
profissionais para outra, que se achava ferida.
O casal foi logo atendido pelo Dr. Doss e, com ele se
dirigiram ao Beco, ou Corredor do Periquito.
No local, o Dr. Doss, - a quem as duas pessoas que o foram
buscar disseram já ter procurado outros médicos, que não as puderam atender,
sendo que o fato ocorrera às 20 horas – encontrou deitada no leito uma mulher
apresentando profundo e grave ferimento no ventre, produzido por instrumento
perfurocortante.
A enferma declarou chamar-se Maria Borges e ter sido ferida,
na rua, quando voltava para casa, por um indivíduo desconhecido que, enfrentando-a,
desferiu-lhe o golpe, logo fugindo precipitadamente.
As declarações de Maria Borges foram confirmadas pelas
pessoas presentes.
Dizia o repórter que obtivera as informações em primeira mão
e que o ocorrido tratava-se de uma grave ocorrência. Neste acontecimento
poderia conter a tentativa de um crime abominável, pois, segundo o exame
médico, ficara bem claro que o ferimento fora feito de baixo para cima,
evidenciando que o intuito do autor daquele crime era atingir as partes
genitais da vítima.
Entretanto, fosse lá como fosse ocaso ainda não era do
conhecimento da polícia, sendo que aquele jornal era o primeiro a divulgá-lo e,
naturalmente que, a partir de então, caberia à polícia investigar e resolver
aquele mistério.
Na matéria posterior a do furo de reportagem dado pelo Correio Mercantil, divulgava este que a
polícia estava procurando esclarecer o crime ocorrido.
O jornal havia fornecido à polícia as informações que
obtivera e que, a partir daquelas, estava à polícia levantando hipóteses quanto
ao misterioso crime.
Naquela manhã, recebera o jornalista, por intermédio do
escrivão de polícia o Sr. Hercio Araújo, o convite do Sr. tenente-coronel
Cristóvão José dos Santos, delegado de polícia, para que ele, ao meio dia,
comparecesse na delegacia.
O jornalista prestou à autoridade os esclarecimentos que
sabia sobre o caso.
Antes dele, já tinha sido ouvida a mulher Maria Borges, a
vítima do misterioso crime.
Disse ela ser moradora no lugar conhecido pela popular
alcunha de Beco do Periquito.
Era uma mulher, de cor parda, ainda moça e de bela
aparência. Era casada, mas vivia separada do marido, que fora soldado do 29º
batalhão de infantaria e que, pouco antes do ocorrido, ao dar baixa, seguira
para a Bahia.
Maria não o quis acompanhar, com receio de que ele lhe
fizesse algum mal, vingando-se do que ela lhe fizera. Nunca se deram bem, e, em
uma discussão entre o casal, Maria Borges esfaqueara o marido.
Era mulher de gênio violento e, segundo a polícia, de maus
precedentes. Na época, havia suspeitas de que Maria andasse envolvida em um
crime que ocorrera dias antes de ter sido ferida da forma misteriosa como fora.
Sobre o atentado, Maria Borges disse o seguinte: não saber a
quem atribuir àquela agressão. Naquela noite, 7 de janeiro, ao chegar à esquina
da Rua Tiradentes com a Andrade Neves, notou um indivíduo parado na calçada
oposta, o qual aproximando-se dela, vibrou-lhe uma facada, pondo-se em seguida
a correr.
Estava assim, no entender do jornalista, comprovado que o
golpe era dirigido as partes genitais de Maria Borges.
“Um novo Jack, o estripador”? indagava o jornalista. E
prosseguia em suas indagações: ou algum amante desesperado da folgazona viúva... em parte?...
Maria Borges disse também não haver contado o ocorrido antes
à polícia porque não conhecendo o indivíduo que a ferira, pensava ela que de
nada adiantaria com a sua queixa.
O Sr. tenente-coronel Cristóvão José dos Santos, além da
imprensa, quem descobrira o fato, e da vítima, ouviu o médico que a tratara, o
Dr. Gustavo Doss.
O depoimento foi secreto.
O Dr. Gustavo Doss, além das declarações que prestou,
respondeu aos quesitos formulados pela polícia, procedendo ao corpo de delito.
Na cidade inteira, foi o sensacional fato comentado o dia
inteiro, especulando-se a seu respeito todo o tipo de comentários.
Considerando o fato de
Jack não ter atacado outra vez, pelo menos em Pelotas, acreditamos que o
Estripador tenha voltado para Londres...
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Fonte de pesquisa:
Bibliotheca Pública de Pelotas/CDOV
Revisão do texto: Jonas Tenfen
Postagem: Bruna Detoni
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