O célebre baile das cozinheiras
Primeira Parte
A.F. Monquelat
O local onde provavelmente funcionou o célebre baile das cozinheiras, entre as décadas de vinte e trinta do século XX à praça Piratinino de Almeida, seja o mesmo em que no dia 8 de dezembro de 1912 a imprensa local tenha se referido como onde funcionava o “maxixe desbragado” no qual o chofer do auto nº 42 da garagem Fabres, Lourival Ávila foi “despojado” do seu relógio pela mundana Maria Assis. Esta o havia convidado para dançar.
A “meliante”, segundo o jornalista, deixara o seu par a “ver navios e deu sebo nos calcanhares” não sendo encontrada pelo motorista no local onde residia, no famoso corredor do Pimpão (Rua Riachuelo, hoje Lobo da Costa, nas proximidades do Camelódromo).
Lourival deu queixa à polícia “que estava agindo”.
Ainda que no local rolasse um maxixe desbragado, frequentado por mundanas despojadoras de relógios, não foi isso o suficiente para estabelecer a fama que nas décadas seguintes o local viria a desfrutar a ponto de ser fechado várias vezes pelas autoridades por denúncias da imprensa.
O nome Baile das Cozinheiras surgiu por primeira vez na imprensa em matéria publicada no A Opinião Pública de 4 de março de 1929. Nesta qual é dito que na sede da Sociedade Floresta do Sul, mais conhecida por Baile das Cozinheiras e onde cada reunião quase sempre terminava em grossa desordem, houve uma discussão no dia anterior, por volta das 2 horas da madrugada, entre João Francisco Oliveira e outros.
Nessa ocasião, um indivíduo que Oliveira supunha ser Basílio de tal, agrediu-o pelas costas, vibrando-lhe três golpes de arma branca que lhe cortaram o paletó, sendo que um o atingiu na região parietal esquerda até a orelha.
Foi ele medicado na Santa Casa e aí ficou, retirando-se no dia seguinte para sua residência à rua General Osório.
Dia 1º de janeiro de 1930, à noite, no Baile das Cozinheiras, Rosa Lemos e Tolentina Nogueira desentenderam-se por causa de uns olhares ensopados de ternura de um rapaz. Trocadas algumas palavras ríspidas, Tolentina, capoeira de saia, vibrou uma cabeçada no ventre de Rosa, com tal força, que a jogou ao chão. Sob fortes dores, a vítima foi conduzida para a Santa Casa, onde ficou internada na enfermaria Nunes Vieira.
Tolentina, após a marrada, fugiu, não sendo encontrada pela polícia.
Em abril de 1932, sob o pseudônimo de Pelotense, publicou o jornal O Libertador em uma de suas colunas que a polícia julgava-se com o direito de proibir a exibição de filmes com excesso de beijos e redução de roupas. Parecia impossível, segundo o articulista, mas havia filmes com mais beijos e menor roupas do que os que, nos cinemas locais, não poucas vezes, eram vistos... Muito mais atentatórios da moral pública, do que tais filmes eram os bailes públicos que em Pelotas se realizavam, com o nome de Bailes das Cozinheiras que, além de indecorosos, eram turbulentos.
Quantas vezes já haviam ocorrido em Pelotas, nos últimos anos, crimes nos Bailes das Cozinheiras!
Há um ano, mais ou menos, prosseguia o jornalista, depois de uma série de violentas desordens, companheiras inseparáveis das farras onde a prostituição e o álcool se reuniam, a polícia proibira os bailes públicos, ordenando o fechamento de suposto clube.
Mas, havia meses, o mesmo suposto clube, mudando o nome, porém conservando as suas torpezas, voltara a funcionar.
No dia anterior, verificara-se mais uma desordem na perniciosa casa de baile.
Se a polícia não podia evitar que nos bailes públicos ocorressem os conflitos, como sempre ocorriam, por que não os proibia de vez, indagava o jornalista.
Seguindo o baile, vamos nos deparar com a notícia de 15 de abril de 1932, onde era dito que, apesar de noticiado o fechamento do celebrizado Clube 3 de Outubro, mais conhecido pelo nome de Baile das Cozinheiras, continuava este foco de desordens em pleno funcionamento.
Dia 14 ainda, aconteceram naquele local as mesmas deploráveis cenas de sempre.
O pessoal arruaceiro, que ali se reunia, promoveu nova baderna da qual resultou a prisão das “crioulas” Maria de Lourdes e Maria Pereira.
A desordem foi tal que até o muro de um prédio vizinho foi derrubado pela parte dos fundos do famigerado clube.
Acrescia que, a algazarra, as palavras pornográficas e toda uma série de inconveniências tornavam o local inaceitável.
As famílias que residiam nas redondezas reclamavam contra aquele estado de coisas que vinham até prejudicando o proprietário de um prédio ao lado do tal “baile”, pois ninguém havia que se animasse a alugá-lo.
Não era possível conceber que um antro daquela natureza fosse digno de proteção para que até então continuasse a afrontar a moral e o sossego público.
Urgia que se tornasse efetiva a medida saneadora, há dias anunciada e que consistia no fechamento definitivo do pseudoclube.
Outro jornal da cidade, no mesmo dia, dizia que em um desafio à moral pública e às próprias autoridades, o celebrizado Clube 3 de Outubro (Baile das Cozinheiras) içara hoje (16-04-1932) a bandeira, o que significava que, apesar de todas as reclamações e as contínuas desordens ali ocorridas, naquela noite haveria novo baile e novas arruaças.
Esse descaso pelo sossego e ordem pública estava sendo objeto de comentários pela cidade.
Para o jornalista de O libertador, era, francamente, estranhável que, depois de uma ordem dada diretamente pela Prefeitura, no sentido do fechamento do Baile das Cozinheiras, esse pseudoclube anunciasse bailes, como o repórter daquele jornal verificara naquela manhã, ao passar pela frente da sede daquele “foco de torpezas e desordens”, ao ver os cartazes colocados à sua frente, anunciando para “logo mais” à noite um baile.
Quarta-feira última, continuava o jornal em sua denúncia: um jornalista de outro jornal da cidade, autorizado, acreditava ele, noticiava que o Sr. Dr. Victor Russomano, vice-prefeito, ordenara o fechamento do Baile das Cozinheiras.
Continua...
Fonte de pesquisa: CDOV – Bibliotheca Pública Pelotense
Imagens: acervo de A.F. Monquelat
Revisão de texto e postagem: Jonas Tenfen
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