quarta-feira, 25 de novembro de 2015
Charqueada do Sr. José Bento de Campos Filho
quinta-feira, 19 de novembro de 2015
Com o Diabo na Praça da República
De
dois cigarros dei cabo,
Fazendo
esta versalhada;
Mas
cigarros da afamada,
Da
popular marca Diabo;
Os
que mais são consumidos
Pelos
fumantes bizarros,
E,
como ouvi de diversos,
São
dados, não vendidos.
Só gosto de ler
bons versos,
Tendo
ao lado bons cigarros...
T.
Em
sessão realizada dia 10 de julho de 1901, à noite, foi lido pela diretoria da
União Gaúcha um ofício encaminhado pelo Sr. João Simões Lopes, no qual era
comunicado àquela instituição que ele iria dar à marca de fumo do
estabelecimento industrial, que estava a instalar nesta cidade, a denominação
de União Gaúcha.
Em
resposta ao ofício, decidiu a diretoria da União Gaúcha agradecer a gentileza
da lembrança do “apreciável” industrialista.
Cremos
que a origem do empreendimento, que Simões Lopes Neto anunciava instalar, fosse
a fábrica de fumos estabelecida há tempo e funcionando com regularidade à Rua
Dr. Pio, na cidade de Rio Grande.
Simões
Lopes deve tê-la adquirido por volta do mês de novembro de 1900 dos Srs. Araújo
Medeiros & Cia. e, logo a seguir, transferido o equipamento para Pelotas.
Em
janeiro de 1901, João Simões & Cia. comunicavam aos seus comitentes e
amigos, que mudaram o seu escritório, da Praça da República [atual Coronel Pedro
Osório], para junto do seu antigo depósito, à Rua Sete de Abril [atual D. Pedro
II] nº 52.
A
fábrica de fumos e cigarros passou a funcionar regularmente em Pelotas, em
agosto de 1901, sob a denominação de Diabo.
O
estabelecimento dividia-se em duas instalações distintas: fábrica, à Rua Independência
[atual Rua Uruguai] nº 73, depósito, e também manufatura à, Rua Sete de Abril
nº 52.
Thomaz,
o Sagaz, em sua coluna intitulada De
Plantão do dia 21 de agosto de 1901 se referindo à nova atividade de Simões
Lopes, diz que todos nós sabíamos que o Bemol, o Sr. Serafim, [referência a um
dos pseudônimos de Simões Lopes] era um notável em diversos misteres...
Entendido
em comércio, em indústria, em administração pública, versado em hipnotismo,
graduado em militância, bacharel no
teatro, maluco pela imprensa, o homem ainda teve tempo para dedicar-se a fumos.
E...
fez o diabo... Nem mais, nem menos...
Agora
mesmo, prosseguia Thomaz, ao deixar sobre a tira aquelas mal traçadas linhas saboreava um adorável caporal da
amostra farta que para a redação mandara o Bemol em latas e pacotinhos de
vários tamanhos e feitios, irrepreensíveis no acondicionamento caprichoso,
preciosos pela qualidade dos produtos que continha.
Os
companheiros aos quais chegou à distribuição do oportuno presente eram unânimes
em elogios às diversas marcas que lhes coube, de onde podiam claramente
concluir que os fumos que fazia o Bemol eram indistintamente de uma qualidade a
toda prova.
Tanto
Thomaz, o colunista, quanto os companheiros não elogiavam mais, porque o
fabricante era capaz de desconfiar.
Que
o fumo era bom, era a mais certa das verdades, e ele estava convencido que,
apesar da sua origem diabólica, o Padre Eterno não arrumaria com outro o seu
secular cachimbo.
Thomaz
encerrava a coluna chamando a atenção dos leitores: “Vejam só que reclame
[propaganda] para o Bemol”.
Concurso de balões como forma de propaganda
O evento ocorreria na festa popular que teria lugar dia 10
de novembro, à noite, na Praça da República e, segundo constava ao jornal, outros
concursos do mesmo gênero ocorreriam.
Com o Diabo na Praça da República
Avultada multidão popular, desde as primeiras horas da noite
do dia 10 de novembro de 1901,afluiu à Praça da República e arredores.
Era profusa a iluminação nos corredores, jardins, a bicos
Auer e lampiões venezianos, numa quantidade inumerável e variedade de copinhos,
lanternas, placas de gelatina, etc., e etc. Nos quarteirões, eram queimados,
seguidamente, fogos de bengala de várias cores.
No chafariz e no lago, havia projeções luminosas.
Pouco depois das 19 horas realizou-se o anunciado concurso
de balões reclame “da importante fábrica de fumos e cigarros marca Diabo”.
Dos quatro (4) balões inscritos, dois retiraram-se. Os dois
que subiram, “aliás, de bonito efeito”, foram ambos desclassificados: o
primeiro, com um lado preto e outro branco, tendo neste bem recortados em
preto, os letreiros e a marca – figura do diabo – caiu pouco adiante.
O segundo balão, realmente bem acabado e que deveria
apresentar o mais vistoso aspecto, ao subir, perfeitamente equilibrado, por um
descuido, deixou ficar em terra, o clou [atrativo principal] do reclame; a
mesma figura diabólica da marca da Fábrica, levando presas diversas engenhosas
lanternas representando exatamente os diversos tipos de pacotinhos dos fumos e
dos cigarros daquela “conhecida e acreditada casa dos Srs. João Simões &
Cia.”.
Foram convidados para juízes o Sr. tenente-coronel Godoy,
despachante Firmo Braga e inspetor Martins.
Queremos aproveitar para dar nossa opinião a respeito da
efemeridade da fábrica, pelo menos tendo Simões como proprietário, que em
hipótese alguma aceitamos a ideia de ter sido em função do boicote da Igreja
Católica aos cigarros, por levarem a marca Diabo. Dentre outros, nos apoiamos no fato de não
haver de forma impressa manifestação alguma neste sentido como, e
principalmente, por ter Simões Lopes vendido a fábrica e a marca, que foi
mantida pelos novos proprietários.
Fontes: Bibliotheca
Pública Pelotense – CDOV – Diário da
Manhã, Pelotas, 07-08-2012, p. 15, A
fábrica Diabo de João Simões & Cia.
Revisão de texto: Jonas
Tenfen
Tratamento de imagem:
Bruna Detoni
sexta-feira, 13 de novembro de 2015
A charqueada do comendador Heleodoro de Azevedo Souza
O estabelecimento do
Sr. Heleodoro de Azevedo Souza tido na década de 80 como único em seu gênero,
pela limpeza e asseio, estava situado à margem esquerda do Canal São Gonçalo,
no porto da cidade de Pelotas.
À esquerda da entrada, estava a casa de moradia do Sr.
Heleodoro, onde “se encontravam todas as comodidades”.
À frente, estava a cancha da matança onde trabalhavam vinte
e cinco carneadores, todos sob a supervisão e fiscalização do proprietário da
charqueada.
Qualquer rês abatida que, por uma eventualidade qualquer, se
sujasse, era imediatamente lavada, bem como o local onde o fato ocorrera, de
forma que a próxima rês encontraria tudo limpo.
Ao lado, estava o galpão de charquear, com ganchos para
duzentas reses.
O galpão era assoalhado e, ali mesmo, estavam as mesas para
a salga, em numero de três, trabalhando em cada mesa duas pessoas.
Havia também, no mesmo galpão, um depósito de sal fino que
comportava quatro mil alqueires. Ainda naquele local se faziam as pilhas de
carne, costumando ser em número de quinze.
A um canto estavam dois bons tanques de laje e cimento, para
as costelas.
Por encanamento, era aproveitada a salmoura, que ia ter ao
tanque de couros, na barraca.
No pátio, em frente, estavam os varais em número suficiente
para a carne de mil e duzentas reses.
Entre o galpão de charquear e a barraca, havia uma grande
eira, de cimento, que servia para estender ao sol o sal a fim de secá-lo.
À beira do Canal, estavam dois tanques grandes, de cimento,
para a lavagem do sebo e tripas, tendo ao pé uma bomba aspirante, movida a mão,
e uma torneira com encanamento da Companhia Hydraulica Pelotense.
A barraca era o local onde faziam o descarne e, ao pé,
estava o tanque de salmoura para duzentos couros, podendo esta barraca
comportar cinco mil couros.
Tinha esta charqueada três trapiches, sendo um para o
embarque dos couros, outro para carnes e gorduras, e outro para o desembarque
do sal.
Na graxeira, havia um bom cilindro, de força de trinta
cavalos dinâmicos, indústria nacional, fabricado na Costa, na oficina dos
sucessores de Vidot.
Em redor, estavam três tinas para graxa e uma para o sebo,
comportando cada a gordura de duzentas reses.
Em oito tinas, volantes, as gorduras esfriavam.
Fora estavam quatro tanques de tijolo, que serviam para
sangrar as tinas e como depósito de resíduos.
O cilindro era suprido por água da Companhia Hydraulica
Pelotense e, ao pé, havia ainda uma bomba aspirante, indústria nacional, também
fabricada na sucessão Vidot, localizada na Costa.
Perto dos tanques para resíduos, havia um poço de vinte
palmos de profundidade.
Ao pé das tinas, havia um compartimento, que servia de
depósito de pipas vazias.
No depósito de graxa, havia duas fornalhas-caldeiras, de
ferro, comportando cada mil e duzentos quilos de graxa.
Ao centro, havia outra caldeira de ferro para esfriar a
graxa e embexigar.
Em frente, estava o depósito de cinza, que servia também de
depósito de barricas e cascos.
No pátio, tinha oito pilhas de madeira para o charque,
situadas à beira do Canal São Gonçalo.
Nesta charqueada, os rondadores eram escolhidos entre os
próprios escravos, sendo “tal distinção” determinada pelo charqueador. No ano
de 1884, era seis o número de rondadores que a charqueada possuía.
Em compartimentos separados, estava a casa de atafona para moer sal, tendo de cada lado um depósito de sal, sendo um para cinco mil alqueires e outro para vinte mil. Havia ainda, em outros compartimentos, um depósito para miudezas, cozinha, senzalas, hospital, um bom depósito para lenha, podendo este comportar a lenha de três barcadas, e um outro para mantimentos.
Tinha uma boa casa para banho, com todas “as comodidades”,
sendo o banheiro bem grande e todo de azulejos, também havia chuveiro.
À direita da entrada, estava a casa do capataz.
Trabalhavam nesta charqueada setenta pessoas, sendo vinte
livres e cinquenta escravos.
Tinham quatro carroças para o serviço, puxadas por animais
cavalares, quatro carroças de mão e trinta carrinhos.
A mangueira era de madeira e nela podiam caber mil e
duzentos animais.
Todo o serviço de cancha era feito com animais cavalares.
O trabalho de matança e charquear eram sempre feitos de dia,
o que era considerado uma ideia digna de imitação “pelos salutares resultados
que apresenta”.
Esta charqueada era a única que tinha encanamento da
Companhia Hydraulica Pelotense.
Todos os galpões eram assoalhados e “faz gosto ver a
limpeza, quer no assoalho quer nas paredes”.
Podia dizer-se, segundo palavras de um visitante, que uma
senhora poderia visitar aquele estabelecimento levando calçados brancos, que
não os mancharia com uma só gota de sangue.
Em todo o serviço, só era desperdiçado o sangue dos animais
abatidos, tudo o mais era aproveitado para diferentes fins.
Possuía o Sr. Heleodoro quinze animais vacuns, de raça, e
cinco cavalares.
Tinha cinco potreiros grandes, dois menores e uma horta
grande.
Todo o serviço era fiscalizado pelo próprio Sr. Heleodoro de
Azevedo, coadjuvado por seus filhos.
Este estabelecimento industrial estava situado ao pé da
cidade, no porto de desembarque e ponto terminal da linha de bondes, sendo por
isso visitado diariamente por muitas pessoas.
Aos 14 dias do mês de janeiro de 1886, um negro, escravo do
Sr. Heleodoro de Azevedo Souza Filho, que fugira da charqueada, foi ferido com
um tiro de bala, que lhe disparou um indivíduo que andava em sua procura para
capturá-lo, segundo ordens do charqueador.
O Sr. Heleodoro de Azevedo Souza faleceu na madrugada de 3
de agosto de 1887, em Pelotas.
Fonte de consulta: Bibliotheca
Pública Pelotense - CDOV
Revisão do texto: Jonas
Tenfen
Tratamento de imagem:
Bruna Detoni
terça-feira, 10 de novembro de 2015
Da Tablada à charqueada*
Estamos em abril de 1882.
O canal de São Gonçalo, um canal levemente tortuoso e que tem, em média, 400 metros de largura, é envolvido, de ambos os lados, por planícies baixas; avistando-se muitas léguas ao fundo, do lado do poente, morros arredondados.
As planícies aluviais, bem acima do nível do canal, em geral coberto de macegas, apresentam-se com uns grupos eventuais de árvores e uma linha tênue de matas encostando as margens.
A atividade comercial da cidade é demonstrada pelo grande número de embarcações do porto; há, pelo menos mais de 50, sem levarmos em conta os vasos miúdos e as chatas.
A cidade é bem traçada, com ruas largas e um extraordinário número de belos prédios públicos e particulares, muitos se defrontando a um grande largo, como se fosse um parque ou jardim, em volta de um hotel, o melhor da cidade. As ruas esgalham-se de ambos os lados, abrigando as principais casas de comércio.
Há um grande número de armazéns, muitos dos quais nada devem aos do Rio de Janeiro e, pelas ruas, paira um ar de prosperidade.
Esta cidade, com seus 20.000 habitantes, deve toda a sua prosperidade à indústria do charque, ou ao comércio com o interior, que diretamente dependente desta.
A parte meridional é quase plana, porém é praticamente coberta por terrenos abertos, próprios para pasto.
Uma das mais características e ao mesmo tempo mais selvagens e interessantes vistas de Pelotas é a Tablada.
A Tablada é um descampado quase liso e extenso, onde, de dezembro a maio, se vendem os rebanhos que chegam.
Ali, rudes gaúchos, vestidos com a habitual camisa de chita, ceroulas fofas ou bombachas e ponchos riscados, galopam em todas as direções, mantendo os animais nos lugares e tentando evitar que as tropas se misturem. O gado, exausto das longas jornadas e espantado com aquela estranha cena, conserva-se junto, movendo os chifres e rugindo em tom de queixa.
O mercado é muito ativo, dada a forte concorrência entre as duas ou três dezenas de charqueadores que ali comparecem; em geral, as boiadas inteiras são vendidas não muito depois das chegadas.
A tropa ou tropas, muitas vezes levadas para uma das charqueadas junto ao arroio Pelotas, são confinadas por muitas horas, em cercados, denominados de mangueiras.
As mangueiras se estreitam em ponta, numa das extremidades, onde se comunicam com um curral menor, chamado de mangueira de matança, capaz de represar 30 cabeças de gado juntas, afocinhando em ambas as extremidades, fortemente cercado, com um pavimento de pedras lisas ou chapões inclinados para a extremidade oposta à entrada; por fora da cerca e rodeando-a, há um passeio de tabuões para os trabalhadores.
A matança em geral ocorre pela manhã.
Lotada a mangueira da matança, é esta fechada e atiram um laço ao chifre ou à cabeça do animal; este laço, passado por um moirão, é preso a uma junta de bois ou cavalos, os quais são tocados imediatamente do curral, arrastando o animal laçado pelo declive escorregadio até embaixo; ali, fica diretamente debaixo da mão do desnucador, que ergue um punhal comprido e muito afiado, e o enfia no pescoço do animal, geralmente entre a primeira vértebra cervical e os ossos occipitais.
Aquele golpe não mata instantaneamente, porém, priva o animal de toda sensibilidade; a seguir o animal cai em um carro de plataforma, que está contínuo com o assoalho da mangueira; levanta-se a seguir uma porta, tirando-se rapidamente o carro, descarregam-no e põem-no de novo no lugar, a tempo de receber outro animal que, nesse meio tempo foi laçado.
Toda a operação leva em torno de um minuto e, na maioria das vezes, numa só charqueada e no decorrer de um dia, matam-se 600 a 700 cabeças de gado.
A carcaça, puxada do carro por um homem a cavalo, vai para o grande prédio em que são executadas as operações restantes, quase sempre executadas por escravos.
Esfola-se, rapidamente, o couro tomando cuidado, ao abrir o pescoço, de enterrar uma faca no coração, que ainda pulsa.
Acabada a esfolação se limpa a carne dos ossos em oito pedaços, que são jogados em estacas horizontais; dois trabalhadores hábeis cortam-na e retalham-na, então, de maneira que cada pedaço fica reduzido à espessura uniforme de cerca de 15 milímetros.
A esta operação utiliza-se um verbo especial: charquear; e, dele, derivam os substantivos charque, charqueada, charqueador, ...
Esfregado bem o sal na carne, empilham-na em camadas, primeiro sal, segunda carne, depois nova camada de sal e assim sucessivamente; as pilhas chegam à altura de vários metros, com o duplo efeito de impregnar a carne de salina e de escorrer os líquidos contidos nela, pela própria pressão; este efeito aumenta-se reempilhando no dia seguinte, de maneira que as camadas de cima, tiradas primeiro, formam a base de nova pilha, e são por sua vez comprimidas.
De 8 a 10 quilos de sal usam-se para a carne e penduram-na em varais, ao ar livre, para secar, tomando cuidado de, à noite, puxá-la para uma ponta do varal e cobri-la com lona.
Para a secagem, preferem tempo um tanto enuviado e ventoso; se chove, empilha-se de novo a carne e, para o fim da safra, quando as chuvas são fortes e mais frequentes, conservam-na empilhada até chegar o tempo seco de setembro e outubro; desta maneira mantém-na quase sempre sem estragar.
Os couros, bem limpos, são metidos na salmoura, que escorre das pilhas de carne; depois de 24 horas, tiram-nos, cobrem-nos de sal, e estão prontos à embarcar para os mercados da Europa, onde os preparados deste modo são muito apreciados e mais valorizados.
A gordura e o sebo são espremidos por aparelhos especiais e dispendiosos, em que se emprega o vapor de alta pressão.
Os ossos incineram-se nas fornalhas que produzem este vapor, e a cinza deles resultante vai para a França, onde a usam como adubo.
As línguas são vendidas aos estabelecimentos especiais que as preparam; os chifres são exportados para diversos usos e, em algumas charqueadas, utilizam o sangue para fazer gelatina.
Cerca de 400.00 cabeças de gado são abatidas anualmente, com pequenas variações de um ano para outro.
Estes animais, negociados na Tablada, totalizam uma operação de mais ou menos 22 mil contos de réis, que são embolsados pelos estancieiros.

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Acervo: Bibliotheca Pública Pelotense - CDOV
Revisão de texto: Jonas Tenfen
quarta-feira, 4 de novembro de 2015
A charqueada do Sr. Joaquim da Silva Tavares
A charqueada do Sr. Joaquim da Silva Tavares, segundo os que
a visitaram na década de 80 do século XIX, era considerada uma das mais
importantes dentre as charqueadas pelotenses.
Estava localizada à margem esquerda do São Gonçalo, na Costa.
À direita do galpão da matança, estavam duas tinas de
madeira para cozinhar sebo, pelo antigo sistema.
Em outro compartimento, estava a fornalha-caldeira, com 3
(três) cilindros, sendo dois deles para aquentar a água e o outro para o vapor,
sendo sua força de 14 (quatorze) cavalos dinâmicos.
Fora dali estavam 3 (três) digeridores, verticais, de ferro,
comportando gorduras de 160 a 170 reses, que eram cozidas em 6 (seis) horas.
Logo que a graxa estava pronta, ia esta por um encanamento
até um depósito, de cimento, de onde outro tubo a levava ao depósito geral.
Ao pé da fornalha, estava uma bomba horizontal, também
movida a vapor, e que enchia as tinas.
A água para o serviço vinha de um poço artesiano, com
sessenta palmos de profundidade, que ficava no pátio. Ao lado ficavam 3 (três)
tanques de cimento, onde ficavam depositados os resíduos da graxa.
Ainda ali, havia um poço com 20 palmos de profundidade.
Na graxeira, estavam 2 (duas) tinas colocadas ao alto, onde,
por um tubo vinha a gordura do tanque de cimento.
As tinas estavam colocadas de tal forma, que podiam encostar
as torneiras às pipas para enchê-las de gordura.
Havia também duas fornalhas-caldeiras para refinar graxa,
comportando cada em torno de 60 arrobas.
A graxeira servia ainda de depósito para barricas e tinha
varais onde colocavam as bexigas.
No pátio de entrada da charqueada, ficava uma bomba
aspirante, indústria nacional, movida a mão. Também havia outra bomba igual,
tendo ao pé um grande tanque de cimento para lavar o sebo de 200 reses,
operação esta que levava duas horas.
Ao centro da charqueada, estava a cancha da matança, onde
trabalhavam 26 carneadores.
A charqueada do Sr. Joca Tavares era, talvez, a única que
aproveitava a água da chuva e, para tal, mandara construir um depósito de ferro com
capacidade para armazenar 400 pipas de água.
No galpão de charquear, havia ganchos para dependurar 250
reses, se necessário, e nele trabalhavam 30 pessoas.
Ao fundo da charqueada, estava o depósito do sal, que
comportava 14 mil alqueires. Tinha no local 3 (três) mesas para a salga,
empregando cada mesa 3 (três) pessoas.
As carroças entravam naquele galpão com o propósito de
carregar o charque para os varais, que estavam no terreiro e eram em quantidade
tal que podiam estender o charque de 1.200 reses.
Na barraca do couro havia um grande tanque, com capacidade
para conter 250 couros, havia também outro tanque onde colocavam as costelas.
Na barraca era possível armazenarem 10.000 couros. O descarne era aproveitado
para a exportação e as garras eram propriedade dos escravos.
Havia no pátio geral da charqueada, 4 (quatro) pilhas[pilastras]
de madeira e palha, para o charque.
No início do mês de janeiro do ano de 1884, eram empregados
nesta charqueada sessenta e cinco pessoas, sendo 48 escravos.
Para o serviço da charqueada, havia a disposição 30 carros
de mão, e 8 (oito) para uso de cavalos.
No serviço marítimo, era usado “um bom iate”, tripulado por
3 (três) homens livres e 1(um) escravo.
A fornalha-caldeira era alimentada à lenha e a carvão
nacional.
Esta charqueada possuía uma mangueira, de madeira, com
capacidade para 800 ou até mesmo 1.000 reses, um curral de espera e um curro, tudo
de madeira.
Ao centro da cancha de carnear, havia um trilho, de ferro,
por aonde um carro conduzia o animal abatido até à frente do carneador.
Em compartimento separado, estavam a senzala, a casa do
capataz, o depósito das carroças e a casa de moradia do proprietário.
Possuía ainda o Sr. Tavares 3 (três) potreiros, sendo 1 (um)
grande e 2 (dois) pequenos, bem como 2 (duas) “bonitas e bem cultivadas
hortas”.
Estava em construção, na época, uma linha férrea para
conduzir o charque até o cais.
A fama da graxa produzida naquela charqueada era tamanha,
que muitas vezes ainda nem estava na graxeira e já estava toda ela vendida.
Quando da visita da princesa Isabel a Pelotas, fevereiro de
1885, disse o jornalista que acompanhou a comitiva, Sr. Maximino Serzedello, ao
descrever algumas das charqueadas por ele visitadas, que todas as outras, a
exceção da do Sr. Joaquim da Silva Tavares, cujas caldeiras para o fabrico do
sebo e cola era de ferro, tinham as suas caldeiras de madeira, o que resultava
no consumo maior de tempo do que a do Sr. Tavares na extração da graxa, sebo,
etc.
Fonte de consulta:
Bibliotheca Pública Pelotense - CDOV
Revisão do texto: Jonas
Tenfen
Tratamento de imagem:
Bruna Detoni
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