quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Primeira Guerra Mundial em Pelotas XII - O ano de 1918 [Encerramento]


Primeira Guerra Mundial em Pelotas XII


O ano de 1918 [Encerramento]


 
Hinderburg em discurso radiofônico, 1932
         
         
         A “Grande Guerra” ou a “Guerra para acabar com todas as guerras” (como se pensou à época) ainda se arrastaria por todo o ano de 1918 pela Europa. O ponto culminante, a abdicação do Kaiser Guilherme II, só ocorreria em novembro daquele ano. Depois vieram uma série de tratados que acabariam por fomentar sentimentos revanchistas: o estofo daquilo que viria a se tornar a Segunda Guerra Mundial.
         Em Pelotas, contudo, os desdobramentos foram menores neste ano. Seja pelo esgotamento de pautas, seja pela certeza de que não haveria um levante boche que tomaria toda a América. O inimigo acuado na Europa deixava de demostrar perigo nas terras da metade sul. Demissões e ostracismo também auxiliaram, pois a presença de falantes de língua alemã arrefeceu consideravelmente no centro da cidade, diminuindo, por consequência, os atritos.
         Como de hábito, as notícias que seguem são do jornal O Rebate, sempre atento aos desdobramentos da guerra e veículo para denuncismos. Damos destaque a dois dados que desenham a importância deste jornal ao período: a cobertura da Noite das Fogueiras e, em segundo lugar, o fato de que este veículo ficou à margem da campanha de propagandas contra a (e as defesas da) Cervejaria Ritter.
         No mais, as miscelâneas.
         Sob o título de “Assim não vai... nada com o s boches”, no mês de janeiro, temos a notícia de um casamente que quase não fora realizado por causa do general Hindenburg. A saber, o Henrique d’Ávila se dirigiu à casa de Ricardo Peckmann para celebrar o casamento da filha deste. Na residência, d’Ávila percebeu pendurada na parede o retratado de Paul von Hinderburg, o comandante do exército imperial alemão. Em protesto, assumiu que não realizaria cerimônia alguma à sombra de semelhante olhar e, não difícil de imaginar, um bate-boca deve ter sido iniciado. Ao fim, Peckmann aceitou retirar o retrato da parede, e a cerimônia de casamento ocorreu normalmente.
         Ainda em janeiro, quase no fim daquele mês, ao lado da longa matéria sobre a coroação da rainha do Club Diamantinos (nos preparativos do carnaval), a notícia de uma briga de bar. O título da matéria, contudo, é um pouco mais épico: Chopps, vivas e pancadaria: boche imprudente, a represália do povo”.
         Domingo passado, começa a matéria, foi aniversário de nascimento de Satanás, atendendo na Terra por Kaiser Guilherme II. No “Bar Sul Rio Grandense” (nome que recentemente adotara o estabelecimento “WatherRhein” para evitar represálias), encontravam-se diversas pessoas a beber chopps da conceituada cervejaria Haertel.
         Vários patrícios ali presentes começaram brindes e vivas ao Brasil, à França, à Itália e aos demais países aliados. Entoaram também o patriótico hino do valoroso Tiro 31. Um dos presentes, contudo, viu oportunidade começou a dar vivas ao Kaiser e à Alemanha.
         A confusão teve início. E fim bastante rápido.
         Aos socos e pontapés, o indivíduo foi expulso do bar e deixado à sarjeta, ferido e aos trapos. Os demais presentes lamentaram a imprudência dele enquanto que os donos do bar se desmanchavam em desculpas, tentando apaziguar os ânimos para que a briga não virasse generalizada.
         Correu notícia pela cidade, e ganhou ares de exagero: não era mais um boche, mas um grupo que no referido local havia entoado o hino “Deutschland uber alles” em homenagem ao Kaiser. O jornal O Rebate fez questão de dizer que isto foi invencionismo, pois apurara com um dos presentes ao acontecimento e nada passou de um viva e de uma surra. Mas era tarde...
         Ontem, o “povo reunido” foi ao referido estabelecimento para depredá-lo a pedradas e golpes de cacetete, quebrando muitos dos vidros e ameaçando ir além: em breve as chamas iriam ganhar vida. Outro grupo de “povo reunido”, também de patrícios, assumiu a postura apaziguadora, argumentando que era para ser evitada a represália enquanto todos os fatos não fossem apurados. Uma força da Brigada Militar chegou ao local para encontrar apenas o bar depredado: os revoltosos já haviam se retirado.
         Encerrando a matéria, “Oxalá sirva este fato de exemplo a uns tantos boches que por aí anda assanhados, sem lembrar-se da crítica situação que se lhes depara...”
         Em março, o desfecho em briga dos desdobramentos de uma notícia que poderia ser falsa. “Pugilato por causa de uma notícia” é título elegante para descrever uma briga de rua onde os envolvidos eram distintos cavalheiros.
         O jornal Echo deu notícias de festa para comemorar o regresso a cidade do Francisco Beherendorf, negociante. A festa fora de caráter íntimo, na residência deste cavalheiro, e, para animar os convidados, um gramofone executou várias peças em alemão.
         O jornal A Opinião Pública fez correção ao fato, por meio de informações prestadas pelo Leopoldo Maciel. O jornal, sem dar naquele momento a fonte, contestou a matéria de Echo, não passava tudo de engano e mentira no que se refere às músicas em alemão.
         Em contragolpe, o Echo reafirmou o exposto, alegando inclusive ter ouvido testemunha presente ao local. Fonte sem nome também possuía o Echo.
         Em resposta, Leopoldo Maciel empenhou seu nome nas páginas de A Opinião Pública, assumindo a responsabilidade pelo afirmado nas páginas deste jornal, assegurando a integridade das informações do veículo.
         Acuado mas não rendido, a resposta do Echo pôs em dúvidas a integridade da honra e da palavra de Leopoldo Maciel. Fim do primeiro round em papel, início do segundo round ao vivo.
         Indignado por ser difamado,  Leopoldo Maciel se dirigiu à redação do Echo para tomar exigir maiores explicações, o que iniciou um acalorado debate com o diretor do jornal, Almeida Peres. Não demorou para este debate se transformar em pugilato, atraindo a atenção dos olhares de quem passava pela rua. Devido a uma queda, Almeida Peres teve um ferimento na face.
         No Diário Popular, uma declaração lacônica tentava dar ponto final aos desentendimentos:

Declaração

Os abaixo-assinados declaram, sob palavra de honra, por isso que se achavam presentes, ser a expressão da verdade o que pela imprensa local publicou o sr. Leopoldo Maciel, relativamente ao falso boato levantado contra a pessoa do Sr. Francisco Behrendorf, por ocasião de sua chegada do Rio de Janeiro.
Pelotas, 14 de março de 1918
Joaquim Luis Osorio
Paulo Gastal.



Fim da série “Primeira Guerra Mundial em Pelotas”.

_________________________________________

Referências: CDOV – Bibliotheca Pública. Fonte da imagem: wikimedia commons.

Nenhum comentário:

Postar um comentário