segunda-feira, 26 de junho de 2017

Osório, o profeta (parte 1)


        
        A quarta visita feita pelo jornalista de O Dia, foi à casa do Osório, o profeta.
       Osório era morador à Rua Conde de Porto Alegre nº602, um chalé.
       Tratava-se de um homem branco, novo, robusto e de grande estatura. O Osório não era, como alguns de seus colegas, natural da África, parecendo ser, pelo sotaque, uruguaio e usava um bigode à americana.
         O jornalista foi introduzido, na sala de espera, por uma mulher que o atendera ao batido.
         Nada de anormal: mobília simples, quadros sem valor.
         Não tardou el profeta.
         De chegada deu ao “cliente” um:
         - Buenas noches.
       Osório era um tipo “limpo de roupa”. Apresentou-se ao cliente com decência. Para melhor conquistar a confiança, foi cativante ao tratar.
        Em princípio pretendeu negar que fosse sacerdote de bruxaria. Fez-se o jornalista de ingênuo.
         Osório não resistiu, entregando-se de corpo e alma... ao domínio público.
         Inventou o repórter uma história. Querendo saber do mal que o atormentava, pois se julgava enfeitiçado por alguém.
      O profeta lançou mão a umas contas cabalísticas e as meteu numa cabaça ou porongo, que agitou repetidas vezes. No meio das contas, havia uma espécie de berloque [enfeite, pingente] em forma de porco, que o Osório disse ser a figura da alma humana.
       Espalhou as contas e começou a ver o que de misterioso e fantástico ia à existência do jornalista.
         - Claro – dizendo ao “cliente” que haviam feito bruxedo.
         - Quem seria? – perguntou o jornalista.
         - Fuera una mujer.
         E continuou:
         - De seis meses até agora, está usted com brujas al cuerpo.
         - Mas, é coisa que mate?
         - Como no?
         Esforçou-se por dizer outras coisas enfadonhas, insípidas, consultando sempre as contas e terminou dizendo que daria uma medicina para matar o bruxedo, que o “cliente” tinha no corpo.
        Pediu ao repórter que voltasse no dia seguinte a buscar a beberagem, cujo preço, depois de alguma insistência do jornalista, disse ser 5$000.
         A consulta custara 3$000, que teve de pagar na hora.
         Dizia o jornalista que o Osório não era exagerado nos seus preços; mas que ele, acreditando piamente que a beberagem do Osório fosse apenas uma infusão inocente, resolvera não voltar para não perder mais tempo com o mandingueiro.



Osório volta a ser notícia na imprensa, 13 anos depois
         Decorridos 13 anos desde a matéria do jornal O Dia, Osório volta às páginas da imprensa local, desta vez aos 21 de outubro de 1929, via A Opinião Pública, em matéria que tratava da infestação de mandingueiros na cidade de Pelotas, fauna da qual eram líderes Madame Corrêa e o mandingueiro Osório, que chegavam ao desplante de publicar anúncios às gazetas e na tela dos cinemas, à vista das autoridades policiais, e do povo todo, como se isso constituísse o negócio mais honesto deste mundo.

O feiticeiro Osório é alvo de uma canoa policial
         As reportagens dos jornais A Opinião Pública e do Diário Popular, dia 22 de janeiro de 1937, sabedoras que as autoridades policiais organizavam uma canoa procuraram, e foram convidadas a, fazer parte desta.
         A batida policial era no palacete, em construção, do Sr. major Antônio Vidal, situado à Rua 15 de Novembro, esquina da Conde de Porto Alegre; pois, no referido prédio, por informação do seu proprietário, se reuniam várias pessoas para praticar a feitiçaria.
         Lá chegados encontraram, efetivamente, objetos “comprometedores”, que foram apreendidos, assim como o ronda da propriedade.
         Como julgassem de pouca importância o resultado daquela diligência, os jornalistas resolveram sugerir, ao Sr. capitão delegado de polícia, uma batida na residência do “conhecido homem das sortes”, Osório, situada a uma quadra do local, onde se encontravam, à Rua Conde de Porto Alegre nº602, esquina Andrade Neves. Aceita que foi a sugestão, a canoa policial se encaminhou em direção ao prédio, aonde, poucos minutos depois, foram encontrar uma “impressionante macumba”.
         Osório recebeu a polícia sem aparente constrangimento, o que deu aos repórteres a impressão que nada seria encontrado.
         Encontraram-se dentro de uma vivenda confortável, mobiliada e decorada com toda a suntuosidade.
         Percorrendo a casa, foram encontrar o templo e o que viram era indescritível. Uma pequena sala atapetada, guarnecida de objetos exóticos, tinha, dentre outras coisas, diversas vasilhas com iguarias as mais variadas e opíparas, frutas as mais caras, velas acesas, uma sopeira cheia de dinheiro em níquel, facções [heresias] e rosários, breves e búzios, farinha amarela e galinha morta, pimenta da Costa e cuias, drogas e ainda mais outras miudezas que, segundo o repórter, seria fatigante enumerá-las.
       Mais adiante, em outra sala, sobre uma mesa havia, um baralho e correspondência.
    Cartas remetendo dinheiro, pedindo consultas e ainda outras acusando o recebimento de remédios.
         Mais adiante, em uma espécie de galpão, encontraram ainda, numerosos santos e velas acesas.
         Ali estavam as “amarrações” para casamento e jogo do bicho: um papel com o nome de um homem e outro com o de uma mulher; uma lista de jogo de bicho com a centena 155 e o final correspondente.

                                                                                     Continua...


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Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública de Pelotas/CDOV
 Revisão do texto: Jonas Tenfen

Postagem: Bruna Detoni

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Raízes da Violência



         Não é fora de propósito afirmar que as raízes da violência na cidade de Pelotas têm sua origem nas charqueadas, ou, por extensão, no ciclo econômico que o charque iniciou e que acarretou na continuidade dessa violência.
         As vítimas da violência praticada, tanto no recinto das charqueadas quanto fora delas, em Pelotas, por causa do longo período de existência dessas, representaram um número bastante expressivo, tanto no mundo rural quanto no urbano.
         Acreditamos que essa onda de violências e barbárie, que ainda hoje se reflete em Pelotas, seja consequência do choque de diversas culturas e grupos étnicos que aqui se estabeleceram no passado. Afora homens do mar, tanto estrangeiros quanto de nacionalidades luso, luso-brasileira ou apenas brasileira que por aqui aportaram.
         Há em toda a linha do tempo da imprensa da cidade, ou mesmo antes do advento desta no ano de 1851, bastando para demonstrar isso uma leitura nos jornais anteriores a esta data, em especial os da cidade de Rio Grande, as mais diversas violências, castigos, crimes de toda espécie em especial contra escravos, crianças, mulheres, habitantes ou não de Pelotas.


         Em certo período, como se já não bastassem os diversos tipos de armas existentes e usadas no cotidiano da cidade, os imigrantes portugueses pobres acrescentaram a essas a navalha. Arma esta bastante usada tanto por homens quanto mulheres, em especial na zona urbana, destacando-se o baixo mundo.
      No entanto, sem dúvida alguma, é no ambiente e território das charqueadas pelotenses onde vamos encontrar a maior incidência de casos, por isso, não nos surpreendeu quando:
         Em meados de agosto de 1908, na charqueada dos Srs. Tavares & Moreira, à margem do canal São Gonçalo, foi bárbara e cruelmente assassinada a facadas a mulher Quintina de tal, branca, de 22 anos de idade, natural deste estado, e que trajava no momento do crime um vestido de chita.
         O assassino chamava-se Antônio Jorge, conhecido por Antônio Larroti, indiático, empregado daquela charqueada.
         Num casebre do estabelecimento viviam eles, há cerca de três anos, amasiados e em perfeita harmonia.
         Também morava em companhia do casal o pequeno Orestes, de 7 anos, filho de Antônio Jorge, de anterior relação.
         Dois dias antes do crime, pela madrugada, Antônio saiu nu, pela estrada em direção à cidade, onde foi logo preso e levado para o xadrez do 1º posto, após ter quebrado os vidros das janelas de várias casas.
         Posto em liberdade, a pedido dos seus patrões, voltou para sua casa, e ali declarou nada saber sobre o que havia ocorrido.
         Agarrando uma grande faca, retirou-se Jorge para a rua, dizendo que ia afiar aquela arma, a fim de terminar com a vida de sua companheira Quintina, promessa que minutos depois cumpriu.
         Amedrontada e espavorida, a malograda Quintina fugiu, pedindo socorro, mas em vão...
         O seu algoz conseguiu agarrá-la e dar-lhe mais de trinta facadas, matando-a imediatamente.
         O rosto da vítima ficou todo retalhado.
         Em vista do ocorrido, o pequeno Orestes foi até a charqueada e deu parte do ocorrido.
         Ao local da tragédia, compareceram o Sr. João da Silva Tavares, que, armando vários empregados, conseguiu prender o assassino, que procurava ferir aquelas pessoas.
         O criminoso estava muito agitado e parecia estar sofrendo das faculdades mentais.
         Tendo sido comunicada, a polícia deu providências, conduzindo Antônio Jorge, em carro correcional, para o xadrez do 3º posto.
         Depois, foi o cadáver de Quintina transportado para o necrotério.
         No 3º posto policial, onde estava preso, o assassino não dizia coisa com coisa...
         O tenente-coronel Cristóvão dos Santos, delegado judiciário, procedeu às diligências necessárias.
         Antônio Jorge, que se dizia viúvo, raptara há três anos a desgraçada Quintina, com quem vivia amasiado e prometera casar-se.
         Pelo Dr. Arnaldo Menezes, médico municipal, foi feito o auto de corpo de delito, constatando mais de quinze ferimentos na cabeça; a mão direita ficou quase decepada; na nuca havia dois profundos ferimentos; as orelhas e o nariz ficaram retalhados; nas costas e tórax, outras facadas.
         O assassino foi logo metido em camisa de força.
         Apresentava Jorge um ferimento na testa, feito quando fora preso e subjugado pelos empregados dos Srs. Tavares & Moreira.
         No dia seguinte ao da tragédia, o criminoso, já sem camisa de força, mantinha-se calmo no xadrez do 3º posto.
         Durante as investigações, soube a imprensa que a vítima era parenta de Nicola Vitola, morador entre os passos de Santa Isabel e Criminoso, no município de São Lourenço.
         Foi ouvido, pela autoridade policial, o menor Orestes, filho de Antônio, que continuava em observação.


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Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública de Pelotas/CDOV
 Revisão do texto: Jonas Tenfen

Postagem: Raquel Balbinoti 

sábado, 17 de junho de 2017

Raízes da Violência


                                                                                     A.F. Monquelat

         Não é fora de propósito afirmar que as raízes da violência na cidade de Pelotas têm sua origem nas charqueadas, ou, por extensão, no ciclo econômico que o charque iniciou, e que acarretou na continuidade dessa violência.
         Os sequelados da violência praticada, tanto no recinto das charqueadas quanto fora delas, em Pelotas, por causa do longo período de existência dessas, representaram um número bastante expressivo, tanto no mundo rural quanto no urbano.
         Acreditamos que essa onda de violências e barbárie, que ainda hoje se reflete em Pelotas, seja consequência do choque de diversas culturas e grupos étnicos que aqui se estabeleceram no passado, afora homens do mar, tanto estrangeiros quanto de nacionalidades luso, luso-brasileira ou apenas brasileira que por aqui aportaram.
         Há em toda a linha do tempo da imprensa da cidade, ou mesmo antes do advento desta no ano de 1851, bastando para demonstrar isso uma leitura nos jornais anteriores a esta data, em especial os da cidade de Rio Grande, as mais diversas violências, castigos, crimes de toda espécie em especial contra escravos, crianças, mulheres, habitantes ou não de Pelotas.
         Em certo período, como se já não bastassem os diversos tipos de armas existentes e usadas no cotidiano da cidade, acrescentaram a essas os imigrantes portugueses pobres, a navalha. Arma esta bastante usada tanto por homens quanto mulheres, em especial na zona urbana, destacando-se o baixo mundo.


         No entanto, sem dúvida alguma, é no ambiente e território das charqueadas pelotenses onde vamos encontrar a maior incidência de casos, por isso, não nos surpreendeu quando:
         Em meados de agosto de 1908, na charqueada dos Srs. Tavares & Moreira, à margem do canal São Gonçalo, foi bárbara e cruelmente assassinada, a facadas, a mulher Quintina de tal, branca, de 22 anos de idade, natural deste estado, e que trajava no momento do crime um vestido de chita.
         O assassino chamava-se Antônio Jorge, conhecido por Antônio Larroti, indiático, empregado daquela charqueada.
         Num casebre do estabelecimento viviam eles, há cerca de três anos, amasiados e em perfeita harmonia.
         Também morava em companhia do casal o pequeno Orestes, de 7 anos, filho de Antônio Jorge, de anterior relação.
         Dois dias antes do crime, pela madrugada, Antônio saiu nu, pela estrada em direção à cidade, onde foi logo preso e levado para o xadrez do 1º posto, após ter quebrado os vidros das janelas de varais casas.
         Posto em liberdade, a pedido dos seus patrões, voltou para sua casa, e ali declarou nada saber sobre o que havia ocorrido.
         Agarrando uma grande faca, retirou-se Jorge para a rua, dizendo que ia afiar aquela arma, a fim de terminar com a vida de sua companheira Quintina, promessa que minutos depois cumpriu.
         Amedrontada e espavorida, a malograda Quintina fugiu, pedindo socorro, mas em vão...
         O seu algoz conseguiu agarrá-la e dar-lhe mais de trinta facadas, matando-a imediatamente.
         O rosto da vítima ficou todo retalhado.
         Em vista do ocorrido, o pequeno Orestes foi até a charqueada e deu parte do ocorrido.
         Ao local da tragédia compareceram o Sr. João da Silva Tavares, que, armando vários empregados, conseguiu prender o assassino, que procurava ferir àquelas pessoas.
         O criminoso estava muito agitado e parecendo estar sofrendo das faculdades mentais.
         Tendo sido comunicada, a polícia deu providências, conduzindo Antônio Jorge, em carro correcional, para o xadrez do 3º posto.
         Depois, foi o cadáver de Quintina transportado para o necrotério.
         No 3º posto policial, onde estava preso, o assassino não dizia coisa com coisa...
         O tenente-coronel Cristóvão dos Santos, delegado judiciário, procedeu às diligências necessárias.
         Antônio Jorge, que se dizia viúvo, raptar há três anos a desgraçada Quintina, com quem vivia amasiado e prometera casar-se.
         Pelo Dr. Arnaldo Menezes, médico municipal, foi feito o auto de corpo de delito, constatando mais de quinze ferimentos na cabeça; a mão direita ficou quase decepada; na nuca havia dois profundos ferimentos; as orelhas e o nariz ficaram retalhados; nas costas e tórax, outras facadas.
         O assassino foi logo metido em camisa de força.
         Apresentava Jorge um ferimento na testa, feito quando fora preso e subjugado pelos empregados dos Srs. Tavares & Moreira.
         No dia seguinte ao da tragédia, o criminoso, já sem camisa de força, mantinha-se calmo no xadrez do 3º posto.
         Durante as investigações, soube a imprensa que a vítima era parenta de Nicola Vitola, morador entre os passos de Santa Isabel e Criminoso, no município de São Lourenço.
         Foi ouvido, pela autoridade policial, o menor Orestes, filho de Antônio, que continuava em observação.

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Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública de Pelotas/CDOV
 Revisão do texto: Jonas Tenfen
Postagem: Raquel Balbinoti


segunda-feira, 12 de junho de 2017

Constantina, a mandingueira (parte 2 e final)




... tinha sido enfeitiçada por alguém que se interessava por separá-los, feitiço esse que fizera o maior efeito, pois a cuja se voltara inteiramente para o empregado do amante.
         O infeliz, sem ânimo para reagir, duplamente enfeitiçado que andava, não só pelo feitiço propriamente dito, como pelo feitiço verdadeiro, que era o demônio da rapariga ter dado para andar triste, desajeitado, chegando ao ponto de chorar.
         Assim, foi ele consultar com a Constantina.      
         Constantina, que tanto era perita em unir quanto em desunir, deu-lhe um excelente remédio, que o ingênuo ministraria à ingratona.
         Foi tiro e queda. Ela brigou com o caixeiro [balconista] e voltou novamente a amar o patrão.
         A feiticeira contou o fato, ao jornalista, tão despudoradamente, que ele achou que ela estivesse zombando dele.
         Mudou ele, então, de assunto para não acabar estourando de rir.
         Perguntou a ela se era possível esconder a gravidez, ao que Constantina em seguida respondeu:
         - Sem dúvida alguma. Eu tenho um remédio que livrará a menina de desgostos futuros, pelo ato que vai praticar.
         E, a seguir, contou-lhe outra história:
         - Há um homem, casado, que está de amores com uma moça solteira. Ela está tomando o remédio de que lhe falo, e graças a ele ninguém sabe disso.
         - No caso de gravidez? – inquiriu o jornalista.
         - Ah! Isto é outra coisa! Não tenha medo. Há também remédio para o desmancho.
         Dizendo isto, a Constantina, sempre risonha, sempre amável, foi a outro compartimento da casa, de onde voltou com uma pequena garrafa.
         - Aqui está o remédio. Faça com que a sua preferida tome isto às colheres de sopa, pela manhã cedo e à noite.
         Aconselhou ainda o meio que ele deveria usar para que o remédio fosse tomado com toda a confiança, sugerindo um sem número de pretextos e, por último, pôs-se inteiramente às ordens do “cliente”... para o resto.
         Acreditava ele que o tal remédio fosse apenas um meio inocente, que a mandingueira usava para enganar papalvos; mas, esperava o resultado da análise.


O resultado da beberagem da Constantina
         “Escola de Agronomia e Veterinária – Laboratório de Química
         Nº 1802                                                     Rs. 25.000
         Recebi do jornal O Dia 300cc de um líquido de cor amarela para analisar.
         Analisada resultou:
         Álcool a 15º c. de temperatura... 32 c.
         Cheiro muito forte de guaco.
         Grande quantidade de açúcar redutor (talvez) mel.
         Foram negativas as pesquisas de canela, cantáridas e alcalóides.
         No fundo da pequena garrafa de Maag-Bitter, na qual nos foi trazido o líquido, existia um pequeno depósito de areia vermelha e de um pó escuro em mistura com detritos vegetais.
         A pesquisa de matérias minerais nesse pó revelou:
         Ácido fosfórico, cal, traços de arsênico e de sódio.
      A pequena quantidade do líquido restante não nos permite a continuação da análise.
         Luiz G. Gomes de Freitas”.
        Em vista do resultado da análise, o jornal alertava que ficassem os D. Juan cientes de que a Constantina, com um pouco de álcool, guaco, areia de cemitério, arsênico e sódio, matérias que por certo ela não conhecia, e que vieram na areia, consegue que as meninas perdessem a cabeça e acompanhassem romanticamente, sem mais aquela, o namorado pouco escrupuloso e velhaco, que deixara cair na gaveta da madraça uns cobres...
 



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Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública de Pelotas/CDOV Revisão do texto: Jonas TenfenPostagem: Bruna Detoni

segunda-feira, 5 de junho de 2017

Constantina, a mandingueira (parte 1)

        



         O jornal O Dia, em sua blitz contra os feiticeiros, bruxos, mandingueiros e outros, foi ter à casa da conhecida mandingueira Constantina, uma parda de estatura baixa, gorda e aparentando ter uns 50 anos de idade.
         Residia ela à Rua Manduca Rodrigues [atual Professor Araújo] nº719, com relativo conforto, o que, para o jornalista, provava à evidência, de que o negócio era rendoso e seguro.
         Esperava o jornalista que, com a campanha saneadora que o jornal vinha desenvolvendo conseguisse, pelo menos, a diminuição do número de infelizes, vítimas da superstição religiosa, filha da ignorância, e causa única dos males que podiam advir de práticas tão condenáveis e espertalhonas.
         Constantina, dizia o repórter, não só vivia com certo conforto como sabia tratar maneirosamente a sua vasta clientela.
         Na sala de recepção, não havia nada de anormal, toda risonha, amável, antegozando os proventos que o cliente estava lhe prometendo.
         Havia, pela sala, uns quadros com retratos de pessoas que, certamente lhe eram caras, estampas, imagens sagradas, etc.
         No vão da janela, uma mesinha. Este móvel foi citado pelo repórter, porque ele iria ser parte importante na farsa que a Constantina protagonizaria com desembaraço profissional.
         Depois que o introduziu na sala, Constantina mandou que se retirassem para o interior da casa, as pessoas que ali se achavam que eram umas mulheres amigas, comadres, ou clientes.
         - Estou às suas ordens, nhonhô – falou Constantina.
         Ao que o jornalista respondeu:
         - Um nosso camarada informou que a senhora faz bruxedos.
         - Quem é o seu camarada, nhonhô.
         - É um companheiro de trabalho. Chama-se Evaristo...
         - Um! Um! Evaristo... Não conheço... – disse Constantina.
         - É. O Evaristo tem um primo que já aqui esteve curando-se com a senhora. Foi o primo do Evaristo...
         - Está bem. Está bem...
         A desconfiança de Constantina foi passageira e não poderia resistir por muito tempo à habilidade com que o jornalista dizia ter se apresentado na casa da mandingueira.
         Olhou-a por um instante e leu ele nos olhos de Constantina um misto de tranquilidade e cobiça.
         Disse-lhe ela então:
         - Que é que quer comigo?
         Principiaram:
         - Estávamos apaixonadíssimos por uma moça...
         A interlocutora dava-lhe a maior atenção:
         - É de família?
         - É, mas... A senhora compreende. A moça é linda e não podemos casar...
         - Isto se arranja – disse Constantina, com uma alegria imensa espalhada pela fisionomia.
         - Então se arranja?
         - Facilmente. Quer ver?
         Levantou-se e foi direto à mesa antes referida. Muniu-se de um baralho e deitou as cartas, tendo antes pedido, depois de baralhá-las, que ele as cortasse 3 por 3 vezes em cruz.
         Com as cartas estendidas na mesa, Constantina as foi recolhendo, ao passo que lhe ia dizendo um monte de fantasias:
         - A menina gosta de você.
         - Gosta?
         - Olé, se gosta! Mas, a família a cuida muito, não é verdade?
         - É exato.
         -Vejo dificuldades... perigos... ela resiste.
         Agora, pensava o repórter, começariam os tropeços... É que a mandingueira preparava terreno para fazer valer o seu trabalho.
         Muniu-se ela de alecrim verde e benzeu-o com largos gestos cruciformes, para que o “corpo do e a alma do cliente” alcançassem êxito em todas as canalhices que ela o supunha capaz, invocando para tal o nome de diversos varões ilustres da igreja.
         Para que a imaginária moça viesse a ceder, ela daria uma droga, um remédio, que disse ela ser de grande eficácia, citando vários casos que lhe atestariam a veracidade do sucesso obtido.
         Cobrou-lhe a “estafante consulta”, o que era de justiça, e prometeu-lhe preparar uma beberagem para o dia seguinte.
         No dia combinado, uma sexta-feira, dia preferido pelos mandingueiros para os seus bruxedos, a sacerdotisa dos manipansos e da arruda mesmo o recebeu, conduzindo-o a um quarto, que era dormitório e templo ao mesmo tempo, pois havia ali uma cama francesa, de casal, dois sofás e, a um canto, um altar, ornado de cortinas de gaze.
         Havia nesse altar umas quantas imagens que, para o jornalista, eram completamente novas e, talvez, ainda não classificadas na galeria dos santos.
         Duas velas esbatiam a sua luz amarela e oscilante, nas figuras dos santos que, dentro do altar, pareciam dançar estranhamente.
         No rebordo do altar, havia algumas ervas.
         A Constantina, com a intenção de fazê-lo ainda mais crédulo, contou-lhe que um Sr., estabelecido na praça, vivia maritalmente com uma mulher, residindo com esta no próprio estabelecimento. A amásia, porém...

                                                                                              Continua...

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Fonte de pesquisa: Bibliotheca Pública de Pelotas/CDOV
 Revisão do texto: Jonas Tenfen
Postagem: Bruna Detoni