quarta-feira, 19 de junho de 2019

A Primeira Guerra Mundial em Pelotas: Parte I - Notas iniciais

A Primeira Guerra Mundial em Pelotas
Parte I – Notas iniciais


A. F. Monquelat
Jonas Tenfen
Kaiser Guilherme II

          No palco dos impérios, antes do fim da segunda década de um século que acabara de iniciar, ocorreu a “guerra para acabar com todas as guerras”. Como os acontecimentos futuros iriam demostrar, essa alcunha daria lugar para o nome atual dos eventos, deixando uma esperança de pacifismo perene para dar lugar a uma contagem megalomaníaca e terrificante: Primeira Guerra Mundial, ocorrida entre 1914 e 1918.
          Ano passado, houve uma série de eventos para rememorar os cem anos do fim dos conflitos; há clássicos tratando do assunto como filmes e livros (o romance “Nada de Novo no Fronte”, de Erich Maria Remarque, por exemplo), bem como mídias mais contemporâneas (videogames e canais no youtube); estuda-se, em bancos escolares, os eventos da Segunda como necessariamente originados na Primeira. Apesar disto, pouco carregamos na memória sobre os eventos, exceto o assassinato de Francisco Ferdinando, as guerras de trincheira e os circos voadores.
          Embora haja acesso a diversificado conteúdo, o afastamento temporal e geográfico faz com que esta seja uma temática pouco presente na nossa memória, ao ponto de esquecermos, ou mesmo desconhecermos, a participação brasileira no conflito. A saber, a participação militar do Brasil foi através de alguns pilotos de avião que integraram a Royal Air Force, seis navios (a Divisão Naval de Operações Guerra, ou DNOG), grupo de médicos e enfermeiros foi enviado para montar hospital em Paris com intuito de auxiliar no combate à gripe espanhola, e oficiais que integraram o exército francês.
          Maior destaque teve DNOG. Primeiramente, por reunir o maior grupo de indivíduos e equipamentos, depois pelos percalços que enfrentou. Enviada para patrulhar a costa da África, bombardeou um grupo de animais marinheiros com a impressão de serem submarinos alemães. O maior inimigo, porém, fora a gripe espanhola: um surto dessa doença matou quase uma centena dos tripulantes. Com algum exagero, atribui-se ao retorno da DNOG para o Brasil como a causa da epidemia de gripe espanhola que assolou o país.
          Nas palavras de João Daniel L. de Almeida: “Foi uma participação limitada, mas não irrelevante.” As maiores conquistas do envolvimento militar brasileiro foram no campo da diplomacia, pois permitiram que o Brasil integrasse a Liga das Nações como membro fundador. A comitiva brasileira da conferência de Paris (1919) foi chefiada por Epitácio Pessoa que depois seria eleito presidente do Brasil. O intuito brasileiro era de que as vitórias fossem brindadas com café, se possível a um preço mais elevado do que se praticava ao grão à época.

Venceslau Brás 

          Antes do fim, o começo. A participação brasileira só fora possível após a declaração de guerra. Durante maior parte dos conflitos, o Brasil se manteve neutro, bastante interessado em fazer comércio com maior número de países possível. Esta posição política se desgastou por pressões internas e por ataques de submarinos alemães a navios mercantes brasileiros (em especial, o vapor Paraná que estava carregado de café). No decreto n° 3.361, o presidente Venceslau Brás pôs fim a neutralidade brasileira com os seguintes termos: 
“Artigo único: Fica reconhecido e proclamado o estado de guerra iniciado pelo Império Alemão contra o Brasil e autorizado o Presidente da República a adotar as providencias constantes da mensagem de 25 de outubro corrente e tomar todas as medidas de defesa, nacional e segurança pública que julgar necessárias, abrindo os créditos precisos ou realizando as operações do crédito que forem convenientes para esse fim; revogadas as disposições em contrário.”
          Dois inimigos a serem combatidos aqui. O primeiro deles era o kaiser Guilherme II, pois, como mostra o texto do decreto, depois de iniciar guerra na Europa resolveu comprar briga com o Brasil. O segundo - mais sútil - era quem ameaçasse a segurança pública. Logo após o fim da Guerra do Contestado (1912 a 1916), Venceslau Brás enfrentou aquela que é tida como a primeira greve brasileira: a Greve Geral de 1917. Havia muito mais inimigos internos do que externos.
          O convite à guerra, já endereçado aos brasileiros em diversas campanhas jornalísticas, fora aceito. As batalhas disponíveis eram contra os alemães e descendentes que viviam no Brasil: onde antes havia animosidades pela proximidade do cotidiano e pelo afastamento da língua, passou haver passeatas, apreensões, saques. Estas ações se concentraram principalmente em dois estados, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, e, neste, encontramos vários casos na cidade de Pelotas.
          É este o tema da série que se inicia: uma coleta da internalização da Primeira Guerra Mundial tendo Pelotas como palco. Usaremos como fonte primária, principalmente, os jornais publicados na cidade à época. Um passeio às claras sobre eventos que aconteciam às escondidas, mostrando como o verniz de cordialidade resiste muito pouco a mais leve intempérie.
          Buscaremos responder a uma pergunta antiga: Foi o assédio do Kaiser à Princesa real ou não?

Continua...

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Imagens: Domínio Público
Referência: Manual do Candidato: História do Brasil, de João Daniel Lima de Almeida (Brasília: Funag, 2013).

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