quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Por que do apelido Xavante?


                                                                                     A.F.Monquelat


         Uma das versões que se inscreve há tempos para ser a versão oficial da origem da expressão Xavante, para denominar o torcedor do Grêmio Esportivo Brasil, de Pelotas, é a de que um dirigente do Esporte Clube Pelotas, no Bra-Pel de nº 102, realizado no reduto dos áureo-cerúleos aos 28 de julho de 1946, depois de um incidente provocado pela torcida dos rubro-negros, teria a eles se referido como se fossem “uns bárbaros”. Acrescentam ainda que, por coincidência, naquela época um dos cinemas da cidade exibia o filme intitulado Invasão dos Xavantes e que, por analogia com os protagonistas, os torcedores do time rival passaram a chamar os torcedores rubro-negros desta forma.     
  


         Próximo àquele clássico Bra-Pel, embora sete anos antes, sob o título de No Reinado dos Xavantes, também denominado de Bandeira Piratininga, fora exibido na sala Alhambra, em São Paulo, aos 10 dias do mês de fevereiro de 1939, este documentário, sob a direção de Wili Aurelli, produção da Americam Films, fotografia de José Carrari, sonografia de Aurélio Aurelli e montagem de Achille Tartari; segundo nos consta, tal documentário não foi exibido em outras salas de cinema do território nacional.
         Posteriormente a produção e exibição daquele documentário, o que houve foi uma matéria veiculada no Diário Popular, desta cidade, em 12 de setembro de 1946, com o seguinte título: “Impressionantes episódios do encontro com os chavantes [sic]”, onde se pode ler que continuavam despertando curiosidade as revelações que estavam sendo feitas pelo funcionário do Serviço de Proteção aos Índios, Sr. Francisco Soares Furtado de Meireles, que chefiara a turma “que teve o primeiro contato com os índios chavantes [sic]” [destaque nosso].

         Considerando as datas, tanto a do documentário (10-02-1939) quanto a da matéria veiculada na imprensa local, via Diário Popular de 12 de setembro de 1946, resta-nos pouca ou quase probabilidade alguma de associarmos o apelido de “xavante” dado ao torcedor rubro-negro, a partir de episódio ocorrido na tarde de 28 de julho de 1946, tarde em que o time do Grêmio Esportivo Brasil venceu ao Esporte Clube Pelotas pelo placar de 5 x 3.
         Diante disto podemos deduzir que a origem do apelido “xavante” não está naquele Bra-Pel, ocorrido na tarde de 28 de julho de 1946; mas, antes de nos debruçarmos em busca da provável motivo desse, vamos repassar alguns aspectos do ocorrido naquele encontro entre os dois times naquela tarde de domingo, reproduzindo alguns detalhes daquele jogo, segundo palavras de um cronista esportivo, que ao famoso Bra-Pel dos 5 x 3 assistiu:
         “Inicia-se o segundo período de jogo, com os ânimos altamente exaltados por força da atuação vacilante do árbitro.
         
           “Aos seis minutos, os protestos da torcida atingem um grau de excitação tal, que

se tornou franco o desentendimento entre juiz e jogadores, tendo aquele adotado a resolução que a todos afigurou absurda, de expulsar do campo, o capitão [Chico Fuleiro] do esquadrão de Teté [técnico do Grêmio Esportivo Brasil].



         “Justamente alarmado em face da perspectiva de passar a atuar desfalcado de um dos seus mais valiosos elementos, o onze rubro-negro procura inutilmente se rearticular. Finalmente, atendendo ao que parece, a determinação de um dos seus dirigentes, e mais do que isso, ao incentivo da torcida decepcionada pela aparente supremacia, até ali demonstrada pelo adversário, tomaram a resolução de abandonar o gramado.
         “Entrementes, o técnico Teté, prevendo em tempo, as consequências desastrosas de semelhante deliberação reconduz seus pupilos ao teatro da luta, exortando-os a prosseguirem nela até o fim. A assistência prorrompe então, em aplausos calorosos a atitude sensata do técnico rubro-negro e a partida se reinicia depois de uma interrupção de alguns minutos”.
         E assim se deu a caminhada, de uma virada histórica, em uma partida que parecia que iria terminar, com a vitória dos áureo-cerúleos, pelo escore de 3 x 1.

Palavras do cronista esportivo de A Opinião Publica sobre o final da partida

         “Clube eminentemente popular, conta o rubro-negro com um núcleo de torcedores verdadeiramente enorme, e foi essa massa vibrando de justo entusiasmo que ao terminar o memorável prélio, invadiu o gramado com o objetivo sadiamente esportivo de expressar aos seus craques a sua gratidão pelo espetáculo sem par com que haviam brindado a assistência” [público] (destaque nosso).  

         E assim concluiu o jornalista: “Carregados em triunfo pela massa de simpatizantes sequiosos de dar expansão ao seu contentamento, o esquadrão de Tefé, recebeu naquele instante como merecido premio a sua atuação sem precedentes, a mais empolgante manifestação que uma torcida pode fazer aos componentes do seu quadro. Enchendo por completo o gramado que fora teatro da peleja, os manifestantes extravasaram assim, a sua alegria tão contagiante, que se apossou e emocionou profundamente a todos quanto a presenciaram, mesmo aqueles que nutriam simpatia pelo outro bando, tal era a sinceridade e a patente espontaneidade da sua exteriorização [destaque nosso].
         “Fundamente sincera, essa manifestação assumiu aspectos de autêntica apoteose”.
         E agora nos cabe perguntar: foram estes os bárbaros? O espetáculo descrito pelo cronista esportivo revela em algum momento atitudes ou comportamento de bárbaros? Não. Se algo de revelador há nessa versão, que não se sustenta é, acima de tudo, o preconceito contra a cultura de um povo indígena...

A provável origem do glorioso apelido

         Meu interesse em buscar a origem desse apelido, xavante, nasceu de um conversa com dois amigos, também rubro-negros, na qual prometi a eles averiguar se as versões que eles conheciam se aproximavam ou tinham algo realmente comprovável.
         A partir de então, resolvi verificar nas notícias, quase diárias na imprensa de Pelotas, se encontrava algo verossímil. Percorrendo jornais existentes na hemeroteca de nossa Bibliotheca Pública, vasculhei duas décadas dos jornais existentes no período de meados dos anos 40 até o final dos anos 50.
                                                                 
                                                                                              Continua...



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 Fontes de pesquisa: Bibliotheca Pública Pelotense-CDOV e acervo particular de Douglas Almeida

Revisão do texto e tratamento de imagem: Jonas Tenfen      

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